Crise muda os conceitos de centro e periferia
A Ásia e a América Latina ganham espaço como principais destinos do Investimento Estrangeiro Direto (IED), enquanto Europa e Estados Unidos veem cair sua participação na fatia do bolo
O mapa do mundo dos investimentos está mudando. A Ásia e a América Latina ganham espaço como principais destinos do Investimento Estrangeiro Direto (IED), enquanto Europa e Estados Unidos veem cair sua participação na fatia do bolo. Ao mesmo tempo, os países latino-americanos devem continuar a receber recursos de fundos de investimento interessados em participar, sobretudo, de projetos de infraestrutura na região.
É cada vez mais difícil falar em um mundo onde há “centro e periferia”, como definiu ontem Javier Santiso, diretor e economista-chefe para a área de desenvolvimento da Organização de Cooperação e Desenvolvimento Econômico (OCDE). Santiso foi um dos palestrantes de painel do World Economic Forum para a América Latina que discutiu as relações entre o hemisfério e a Ásia.
No evento, encerrado ontem no Rio, líderes empresariais presentes emitiram declaração destinada aos chefes de Estado que participarão, a partir de hoje, da Cúpula das Américas, em Trinidad e Tobago. No documento, a comunidade de negócios do continente afirma que uma forte colaboração é necessária para enfrentar a turbulência econômica mundial.
“Nós acreditamos que, juntos, podemos fortalecer a democracia na região e vislumbrar um novo ciclo em nossa história econômica com governos, empresários e comunidades trabalhando mais próximos”, diz um trecho da declaração. O documento sugere que os esforços devem ser focados na existência de instituições fortes, no livre comércio e em tecnologias sustentáveis. E sugere cinco prioridades, incluindo apoio financeiro para agências internacionais e bancos de desenvolvimento; promoção de esforços para revigorar o comércio mundial e investimento como forma de prevenir barreiras ao comércio e medidas protecionistas. Os líderes também enfatizam a necessidade de dar liquidez de curto prazo ao sistema global.
Santiso, da OCDE, disse que uma das tendências mais interessantes surgidas antes mesmo da crise foi o fortalecimento das relações Sul-Sul. Isso remete, segundo ele, à ideia do relacionamento entre América Latina e Ásia, incluindo a China. “Como consequência, os países da OCDE tendem a prestar mais atenção na América Latina”, disse Santiso. Ele afirmou que há três anos o IED vinha sobretudo da OCDE, formada pelos países industrializados. E completou: “A OCDE hoje já não é o centro do mundo.”
Ele também comentou os efeitos do cenário de restrição de crédito e de desalavancagem do setor financeiro. “Antes da crise, investir na OCDE era sinônimo de risco e retorno baixos, enquanto investir na América Latina era o contrário (risco e retorno altos). Agora essas são verdades questionáveis.”
Alessandro Teixeira, presidente da Apex, a agência de promoção de investimentos do governo brasileiro, citou os números recentes do IED. Disse que a União Europeia e os Estados Unidos que há cinco anos representavam 50% e 22% do IED do mundo, respectivamente, caíram para 42% e 15%. “Houve uma mudança na atração de investimentos”, afirmou. Já a América Latina, que respondia por cerca de 3% a 4% do investimento estrangeiro direto, chegou a 8% no ano passado, disse Teixeira citando dados da Waipa e da Unctad.
Teixeira disse que a taxa de retorno na América Latina é boa e o resultado do investimento costuma aparecer rápido. Luiz Fernando Furlan, presidente do conselho da Sadia, lembrou que nos últimos anos houve grande aumento no número de empresas brasileiras que se tornaram multinacionais.
Lord Brennan, membro do conselho da Matrix Chambers, da Inglaterra, previu que recursos dos fundos de investimento continuarão a fluir para a América Latina, em especial para projetos de infraestrutura. No painel no qual Brennan participou foi citado o interesse do Oriente Médio, incluindo Qatar, Abudabi e Emirados Árabes, e também de países asiáticos em investir na América Latina.
Brennan mencionou o interesse de investidores chineses e árabes na compra de terras na América Latina. Nos debates, questionado se considerava que seria necessária regulamentação para tratar da compra de terras por estrangeiros na região, ele disse que o importante é ter uma supervisão clara.
Do Valor Econômico