Desemprego faz pressão sobre juros, segundo jornal
Para alguns especialistas, a posição do Copom será um sinalizador importante para o setor produtivo medir a chance de disseminação pela economia da crise iniciada no setor de bens duráveis, como automóveis
Pela primeira vez, desde que o Copom (Comitê de Política Monetária) foi criado, em junho de 1996, os diretores do Banco Central se reunirão para definir o rumo da taxa de juros pressionados pela ameaça de uma onda generalizada de desemprego.
Apesar de a esperada decisão de reduzir os juros –depois de quatro altas e três meses de estabilidade– ter pouco ou nenhum impacto direto para reverter esse quadro, a repercussão indireta da medida terá uma abrangência maior para isso do que em outros momentos de queda no crescimento econômico.
Na avaliação de empresários e economistas ouvidos pela Folha, a posição do Copom será um sinalizador importante para o setor produtivo medir a chance de disseminação pela economia da crise iniciada no setor de bens duráveis, como automóveis. Mostrará ainda uma disposição coordenada dentro do governo de combater recessão e desemprego com todas as armas disponíveis.
Se, por um lado, um corte de 0,50 ou 0,75 ponto percentual, como se espera, não tem, por si só, o poder de impedir que as montadoras demitam, por outro, indicará que a duração da recessão econômica poderá ser menor do que se imagina.
“Ao contrário do que se pensa, demitir custa caro para as empresas que investem em treinamento e têm gastos altos com rescisão de contrato. Se há perspectiva de melhora da atividade no curto prazo, o empresário segura o emprego ainda que tenha que assumir um prejuízo ou reduzir o lucro por um período”, avalia o ex-presidente do Banco Central Gustavo Loyola.
“Um corte de juros mostrará que o BC mudou sua postura e reconhece que tem um ajuste forte em curso na economia que se traduzirá em queda na inflação mais à frente. Com isso, não é preciso esperar a inflação cair de fato para agir”, argumenta a economista-chefe do banco ING, Zeina Latif.
“Uma flexibilização da política monetária é relevante neste momento em que o baque no crédito é seguido de uma rápida deterioração do mercado de trabalho. A queda acelerada do emprego é o que diferencia esse choque dos outros vividos e, por isso, exige uma ação de política monetária diferente da feita até agora”, diz Fábio Akira, economista do JP Morgan.
Segundo a Folha apurou, dentro do próprio BC há adeptos dessa tese. Afinal, o que segurou o discurso do presidente da instituição, Henrique Meirelles, para destacar a boa performance da economia brasileira em meio à crise foi justamente o forte crescimento da demanda doméstica, financiado por crédito farto e aumento da renda.
Projeções
O mercado de crédito já entrou em colapso, e as projeções até agora são de que, assim que as coisas melhorarem, o ritmo de crescimento será reduzido à metade: passará do patamar de 30% ao ano para cerca de 15%.
Esse cenário levou para o buraco setores altamente dependentes de financiamento, como o imobiliário e o automobilístico, e o que tem ajudado no crescimento são os segmentos mais sensíveis à renda: bens semiduráveis e não-duráveis, como roupas, calçados e alimentos.
Um baque generalizado no nível de emprego no país –ou mesmo a perspectiva de que isso poderá acontecer em 2009– reduzirá a renda e poderá disseminar a crise pela economia como uma bola de neve.
Por outro lado, o Banco Central sempre faz questão de insistir que a principal preocupação da instituição é com a inflação e que, mesmo com cenário de queda no crescimento, a inflação ainda está sob a ameaça da desvalorização do real e das expectativas para 2009, que continuam elevadas.
Essa corrente, defendida com ênfase até o final do mês passado pelo diretor de Política Econômica, Mário Mesquita, porém, ganhou novas variáveis depois que o IBGE divulgou dados de queda na produção industrial e no comércio no final do ano passado.
Além disso, as expectativas de mercado para o IPCA (Índice de Preços ao Consumidor Amplo) neste ano caíram, aproximando-se mais do centro da meta do ano, de 4,5%, a perspectiva de crescimento está sendo reavaliada para baixo e a inflação de 2008 ficou em 5,9%, menor que os 6,2% previstos.
Como todos esses fatores fazem parte do modelo econômico do Banco Central para avaliar a tendência da inflação e, assim, definir a taxa de juros, eles podem abrir caminho para cortes mais fortes na reunião desta semana.
Da Folha de São Paulo