Desoneração da folha de pagamento pode não garantir competitividade para indústria

A desoneração setorial da folha de pagamento pode não ter a eficácia necessária para aumentar a competitividade da indústria, na visão do diretor-técnico do Departamento Intersindical de Estudos Socioeconômicos (Dieese), Clemente Ganz Lúcio. A medida está entre as anunciadas no início de agosto pelo governo federal, dentro do plano Brasil Maior, e contempla alguns ramos que empregam uma quantidade maior de mão de obra, como o têxtil e o moveleiro.

A intenção do governo com a nova política industrial é aumentar a capacidade do setor no país de concorrer com a produção de outros países, especialmente os asiáticos. A desoneração foi um dos itens incluídos por pressão de empresários, que atribuem aos encargos que incidem sobre a folha de pagamento a responsabilidade pela perda de competitividade de bens de consumo manufaturados no Brasil. A alegação é de que países como a China têm, no baixo custo de mão de obra, um dos fatores para conseguir vender mais barato. O que o economista do Dieese sustenta é que a conta pode não ser tão simples.

Para Ganz Lúcio, que nesta quarta-feira (24) participa de seminário sobre tributação, em São Paulo, os efeitos da desoneração da folha, se vierem, demorarão algum tempo para serem sentidos. Isso porque qualquer alteração em aspectos tributários têm resultados mais complexos, sem proporcionar efeitos diretos. “O movimento pode criar uma ´intensidade de impacto´, mas não ajudar como se espera na (ampliação da) competividade.” Ele explicou que ainda é cedo para avaliar a medida na estrutura tributária das empresas.

O diretor-técnico do Dieese avalia ainda que “medidas parciais” como a anunciada no início do mês podem trazer riscos para a discussão da reforma tributária como um todo. “Ela (a reforma) está sendo dividida em pedaços. Temos de olhar para o assunto de forma ampla, sem excluir nenhum ponto.” Ele disse que é preciso evitar que o debate chegue ao Congresso “já distorcido”.

Uma das principais preocupações é que a fragmentação provoque efeitos danosos à seguridade social. O Brasil Maior transferiu da folha de pagamento para um tributo sobre o lucro líquido da indústria a contribuição patronal para o Instituto Nacional do Seguro Social (INSS). A medida pode representar riscos para as contas da Previdência Social.

Apesar dessa possibilidade, o presidente do Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada (Ipea), Marcio Pochmann, disse acreditar que a fórmula encontrada para a desoneração abre caminho para debater o impacto sobre a Previdenciária Social. A avaliação é de que há espaço para se criar mais contrapartidas.

Para ele, as exigências tanto sociais como econômicas são “questões muito importantes para que haja uma equalização” na estrutura tributária. Ao lado do movimento sindical, o Ipea fará parte da equipe que vai acompanhar a implementações das medidas previstas no Brasil Maior.

Crise
A respeito da crise internacional, Pochmann acredita que o país está em um momento diferente do que em 2008. Há três anos, o governo adotou uma postura “menos ativa” em relação ao cenário internacional, segundo o economista. A opção foi estimular as famílias a manterem seu padrão de consumo como forma de manter a economia aquecida. “Em 2008, estávamos indo contra a maré e acelerando, enquanto o mundo desacelerava”, lembrou.

Os trunfos atuais, segundo ele, são o fortalecimento do mercado interno e o reconhecimento internacional que o país conquistou nos últimos anos. “É um excelente momento para o Brasil, este em que vemos a queda de ações de diversas empresas multinacionais. Agora podemos fortalecer especialmente os laços no Mercosul e também fora dele”, afirma Pochmann.

Da Rede Brasil Atual