´É difícil encontrar empresa que não tenha financiado o golpe´, diz ex-governador
Paulo Egydio, ao centro, admitiu ser apoiador do golpe desde antes de 1964, mas disse não aceitar a tortura
Comissão da Verdade da Câmara Municipal ouviu de Paulo Egydio Martins, que governou o estado de São Paulo entre 1975 e 1979
O ex-governador “biônico” de São Paulo Paulo Egydio Martins, que comandou o estado entre 1975 e 1979, durante a ditadura, afirmou ontem (26) que muitas empresas financiaram o golpe contra João Goulart, presidente deposto pelo golpe em 1º de abril de 1964. “É difícil encontrar alguém que não tenha financiado a conspiração”, disse, em depoimento à Comissão da Verdade da Câmara Municipal de São Paulo. “O volume de dinheiro repassado aos coronéis aumentava a cada discurso inflamado do Jango”, disse Paulo Egydio.
Segundo o ex-governador, os empresários usavam dinheiro de caixa dois nessas doações. “Ninguém doava dinheiro de lucro”, afirmou. No depoimento, ele negou que soubesse do financiamento dos órgãos de tortura e da própria estrutura da ditadura.
Egydio afirmou que fazia parte do núcleo de pensamento estratégico da conspiração, que contava com outras figuras ilustres, como o ex-diretor do jornal O Estado de São Paulo Júlio de Mesquita Filho.
Para o ex-governador, que também foi ministro do Desenvolvimento no governo Castello Branco (1964-66), as mortes do jornalista Vladimir Herzog e do metalúrgico Manuel Fiel Filho, em 1975 e 1976, respectivamente, assassinados sob tortura no DOI-Codi, foram planejadas pela linha dura do regime, com o suposto objetivo de desestabilizar o governo do general Ernesto Geisel.
“Não é possível que alguém acredite que Herzog pudesse representar uma ameaça nacional. Um metalúrgico que distribuía a Voz Operária poderia ser uma ameaça nacional? Não tinha nada que mostrasse que ele e Herzog oferecessem algum tipo de risco, mas com a morte deles a população iria ficar exaltada e aí seria justificada uma ação mais violenta do Exército”, afirmou.
“Eu era um homem de confiança do Geisel em São Paulo. Militares linha dura, como o ex-ministro do Exército Sylvio Frota, não queriam que o Geisel efetivasse a abertura política. Causando problemas em São Paulo, esperavam atingir o presidente”, disse Egydio.
Ele destacou a destituição do comandante do II exército, Ednardo D’Ávila Mello, após os assassinatos. “Um caso inédito na história do Brasil. Nem na Guerra do Paraguai houve a dispensa de um militar de alta patente”, afirmou.
Para o vereador Gilberto Natalini (PV), presidente da comissão, o depoimento é importante pela representatividade do ex-governador. “Ele participou da articulação e do governo, conhece o processo por dentro. Negou conhecimento sobre algumas coisas, como da estrutura do DOI-Codi, que não é possível crer que não tivesse, na posição dele. Mas foi um bom depoimento”, considerou.
A última reunião de 2013 da Comissão da Verdade da Câmara Municipal será em 10 de dezembro, às 10h. Nela será ouvido João Vicente Goulart, filho do ex-presidente deposto João Goulart.
Da Rede Brasil Atual