Eleição na Câmara: Derrotados fomos nós
A eleição de Severino Cavalcanti para presidência da Câmara dos Deputados na terça-feira, foi definida pelos jornais como o maior retrocesso político do Brasil. O que ninguém disse até agora é que esta é mais uma tentativa de rearticulação da elite do Brasil que não engoliu a eleição de um trabalhador, o presidente Lula, para a Presidência da República.
Severino, conhecido como rei do baixo clero, denominação dada a deputados que não conseguem se destacar na Câmara, sempre defendeu a tese de que os deputados têm que ter mais verbas e maiores salários.
Em seu último cargo, na segunda secretaria da Mesa Diretora, caprichou na defesa dos interesses dos colegas. Na campanha para presidência da Câmara, ganhou muitos votos ao prometer aumentar os salários dos deputados federais de R$ 12.800,00 para R$ 21.500,00.
Severino já trocou muitas vezes de partido (ele começou a carreira na UDN em 1962, passou pela Arena, PDS, PDC, PL, PPR, PFL, PPB e PP) e quer recompensar os deputados que lhe deram os votos, metendo a mão no bolso do povo. Ao dar sinal verde para o abusivo aumento dos salários e verbas dos deputados federais, o novo presidente provoca um efeito cascata porque os deputados estaduais recebem o equivalente a 75% do ganho dos federais.
O mesmo ocorre em centenas de municípios brasileiros, como é o caso de São Paulo, onde a lei orgânica determina que os vereadores devem ganhar 75% do salário dos deputados estaduais.
Avaliação séria
Como se vê, a principal proposta do novo presidente da Câmara Federal terá o efeito de uma enorme “tsunami” sobre os cofres públicos. E ainda tem gente alegre com esta desgraça, atribuindo a derrota apenas ao PT. É verdade que tanto o governo Lula quanto o PT precisam fazer uma avaliação muito séria de todos os erros cometidos neste processo desastroso. Mas derrotados fomos todos nós, trabalhadores e brasileiros que lutam para transformar o Brasil numa nação justa.
Além de fisiologista, Severino é um ultraconservador que pode barrar projetos importantes para todos os brasileiros. Entre eles, o projeto que autoriza a pesquisa com células-tronco, que pode, no futuro, salvar as vidas de milhares de pacientes vítimas de Alzheimer, Parkinson e doenças neuromusculares em geral.
O deputado também declarou que acha dispensável a assinatura na carteira do trabalhador e de que é necessário enxugar a CLT. Para ele, o trabalho escravo é justificável.
Escudeiro da ditadura
O currículo do deputado tem outros exemplos de atitudes retrógradas. É sempre bom lembrar, por exemplo, que ele foi um fiel escudeiro da ditadura militar. Deputado estadual por 28 anos; em 1980, Severino se aliou ao ex-presidente João Baptista Figueiredo, para expulsar o padre italiano Vito Miracapillo do País. O padre era ligado aos movimentos sociais e sua atuação incomodava os usineiros.
Para completar, Severino enche o peito quando se define como despachante de interesses paroquiais. Isso mostra o que podemos esperar do parlamento federal nesta legislatura.