Escravidão moderna

Sindicato alerta que, além do combate às situações extremas de escravidão, é preciso lutar contra as relações de trabalho autoritárias, com trabalhadores submetidos às mais diversas formas de pressão e assédio pelos patrões

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Desde que se intensificaram os ataques aos direitos fundamentais e sociais à classe trabalhadora, o Sindicato chamou a atenção para a existência de contradições e dívidas históricas em todo o país. Ainda assim, a reforma Trabalhista, iniciada no pós-golpe à presidenta Dilma Rousseff e consolidada pela força política que esteve à frente do país nos últimos anos, negligenciou uma dura realidade imposta por parte de setores econômicos: o trabalho em condições análogas ao escravo.

A escravidão que conhecemos no século XVI, durante o período colonial, não ficou para trás. Passados cinco séculos, o domínio do trabalhador pela força nunca foi erradicado do país. Em pleno século XXI, escravagistas modernos, herdeiros da chibata, aliciam trabalhadores nos centros urbanos e rurais, com falsas promessas de trabalho decente, salário digno e moradia adequada. Apreensão de documentos, humilhações, ameaças e mortes são constantes, em que pese esta prática abominável ser considerada crime.

Números alarmantes

Em 1992, o Brasil reconheceu perante a OIT (Organização Internacional do Trabalho), a existência de 8 milhões de crianças exploradas no trabalho, grande parte no cultivo da cana-de-açúcar. Neste mesmo ano, assinou um convênio com o Programa Internacional para Eliminação do Trabalho Infantil. Mas, ainda hoje, crianças são escravizadas e prostituídas

Em 1995, novamente o governo reconheceu, diante das Nações Unidas, a existência de trabalho escravo contemporâneo no Brasil. Até 2019, aproximadamente 54 mil trabalhadores foram resgatados em mais de 5 mil locais de trabalho, segundo dados do Ministério do Trabalho.

Recentemente foi divulgado o resgate de trabalhadores no Sul do país, aliciados na Bahia. Este grupo permaneceu em cárcere, realizou jornadas exaustivas, sofreu castigos com choques elétricos e spray de pimenta.

Escravidão moderna

Ao mesmo tempo em que esta situação extrema de escravidão precisa ser combatida para que os trabalhadores sigam adiante com dignidade, não se pode perder de vista o fato de que predomina no Brasil relações de trabalho autoritárias, onde milhões de trabalhadores são submetidos diariamente às mais diversas formas de pressão e de assédio pelos patrões.

Foto: Adonis Guerra

“Em dado momento, os trabalhadores foram induzidos a pensar que só os empregos seriam suficientes. Que não precisariam de direitos básicos, como segurança e saúde no trabalho, férias, descansos aos domingos, jornada justa de trabalho, negociação coletiva e um sindicato forte, capaz de representá-los em todas as suas demandas”, explicou o diretor executivo do Sindicato, Luiz Carlos da Silva Dias, o Luizão.

“É preciso combater essa força predadora, quase invisível, que se instala nas mentes e nas atitudes no dia a dia do chão de fábrica, que naturaliza relações de opressão associadas a processos discriminatórios, sobretudo de classe”.

O dirigente destacou que é preciso ir além nesse tema. “Temos que compreender que qualquer forma de assédio no trabalho tem como ponto de partida a transformação do trabalhador em propriedade privada do empregador e, desde a sua contratação, quando se submete às regras previamente impostas, sem direito à contestação”.

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Assédio eleitoral

O assédio eleitoral, praticado em larga escala por empregadores em 2022, é o exemplo mais recente de tentativa de domínio da consciência dos trabalhadores pelos setores econômicos, o que foi rapidamente combatido pelo Sindicato.

“Nenhum tipo de pressão política contra os trabalhadores pode passar impune”, disse Luizão. 

Coragem para reagir

Os últimos anos não foram fáceis e serão lembrados como um período sombrio para a classe trabalhadora. Direitos sociais e fundamentais conquistados tão arduamente ao longo dos anos foram negados por aqueles que visam lucrar cada vez mais.

Para servir a este propósito, instalou-se uma onda de retrocesso social sem precedentes na história do Brasil, especialmente com a reforma Trabalhista, que facilitou o caminho tanto para a escravização de trabalhadores, quanto para a consolidação de modelos ditatoriais de relações do trabalho.

“Com a vitória da democracia, em 2022, os trabalhadores retomaram o protagonismo e com ele o direito de dialogar, de propor, de ter e de lutar pelas suas pautas, de não serem intimidados, de avançar em suas conquistas, de brigar por um sindicato representativo”, ressaltou Luizão. 

Em busca de efetivar esses direitos, que são básicos para uma vida digna, os Metalúrgicos do ABC vêm atuando de maneira firme no propósito de defender a justiça social como forma de transformar a vida dos trabalhadores e do povo brasileiro.

“A erradicação do trabalho escravo ‘moderno’ passa pela defesa de novas práticas trabalhistas pelos empregadores, novas relações de trabalho, novos modelos de organização sindical e pela construção legal de mecanismos que garantam, de maneira efetiva, a negociação coletiva como direito de todo trabalhador”, defendeu.

“Por isso, é preciso coragem para reagir e muita solidariedade de classe. O Brasil não pode aceitar que nenhum trabalhador seja considerado e tratado como propriedade do empregador”, concluiu.