Estoques ficam acima do previsto em quase 80% dos setores industriais

A acumulação de estoques pela indústria acelerou-se em julho, apontando para uma produção fraca do setor nos próximos meses, a exemplo do que já ocorreu no segundo trimestre. O indicador da Confederação Nacional da Indústria (CNI) que compara o inventário efetivo com o planejado pelas empresas subiu de 53 pontos em junho para 53,9 pontos no mês passado. Quando o índice está acima de 50, a leitura é de que ele ficou acima do volume programado pelos empresários. Os números da CNI mostram ainda que o acúmulo de estoques excessivos é generalizado, uma vez que 20 dos 26 segmentos da indústria pesquisados registraram um número superior a 50 pontos – em junho, eram 17.

O gerente-executivo de política econômica da CNI, Flávio Castelo Branco, vê o aumento da participação dos produtos importados no mercado interno como um dos principais motivos para o acúmulo de estoques indesejados. A demanda, ainda que em desaceleração, segue num ritmo de crescimento razoável, como mostram as vendas no varejo ampliadas, que reúnem veículos e autopeças e material de construção. De janeiro a junho, elas cresceram 9,2% em relação ao mesmo período do ano passado – nesse intervalo, a produção industrial avançou apenas 1,7%. Segundo Castelo Branco, a indústria está perdendo uma oportunidade importante de crescimento, por não conseguir aproveitar o aumento da demanda.

O economista-chefe do Banco Fator, José Francisco de Lima Gonçalves, também aponta a concorrência feroz com os bens estrangeiros como o responsável por esse acúmulo indesejado de estoques. “Não é por falta de demanda que os estoques estão em alta”, diz Gonçalves, também professor da Faculdade de Economia, Administração e Contabilidade (FEA) da USP. “O problema é o câmbio, que está muito valorizado.”

Castelo Branco também diz que a dificuldade em exportar ajuda a explicar a acumulação de inventários excessivos. O próprio crescimento da atividade econômica um pouco mais fraco do país neste ano também contribui para esse processo, num cenário marcado pela elevação dos juros e pelas medidas de restrição ao crédito, acredita ele.

Setores que têm sofrido muito com a concorrência externa são os exibem estoques mais elevados na pesquisa da CNI. É o caso da indústria têxtil, de calçados e de máquinas e materiais elétricos. O indicador do setor de calçados, por exemplo, atingiu 61 pontos em julho, acima dos 58,1 de junho, mesmo com a utilização de capacidade instalada no setor bastante abaixo do usual, em 40,3 pontos – o nível considerado normal é 50.

No setor têxtil, o índice caiu de 59,2 em junho para 58,4 pontos no mês passado, ainda assim um número alto. No caso de máquinas e materiais elétricos, houve alta de 53,9 para 56,1 pontos. Outros segmentos com grande peso na indústria também têm inventários acima do planejado, como o de alimentos e químico.

Todos esses números indicam que as perspectivas para a produção industrial nos próximos meses estão longe de ser favoráveis. “O quadro sugere um enfraquecimento da produção até que os estoques acima do planejado sejam ajustados”, diz Castelo Branco. Para ele, a indústria no terceiro trimestre deve ter um comportamento parecido ao do trimestre anterior. De abril a junho, a produção industrial recuou 0,7% em relação aos três meses anterior, feito o ajuste sazonal.

Gonçalves também vê um período pouco promissor para o segmento no resto do ano, projetando expansão de 3,3% para a indústria em 2011 – em 2010, a alta foi de 10,5%. Há quem esteja amais pessimista, como a LCA Consultores, que projeta expansão de 2,5%.

O indicador da CNI para o setor de veículos ficou em 50 pontos em julho, acima dos 48,2 de junho, mas no nível considerado dentro do planejado pelas empresas. Números da Associação Nacional dos Fabricantes de Veículos Automotores (Anfavea), contudo, mostraram que os inventários fecharam o mês passado em 367,1 mil unidades, 25 mil a mais que no mês anterior, no nível mais alto da história.

Do Valor Econômico