Estudo alerta para riscos de relaxamento após vacinação contra covid-19
Cientistas alertam que, se houver abandono dos protocolos sanitários, haverá novos surtos do vírus
O distanciamento social e o uso de máscaras serão necessários após a vacinação em massa contra a covid-19 e o relaxamento de protocolos pode trazer riscos à população. Estudo publicado na revista científica The Lancet aponta para a possibilidade de novas ondas de infecções e mortes, apesar de reduzidas, pela falta de continuidade de políticas sanitárias após a aplicação das vacinas.
“Para todos os cenários de vacinação que investigamos, nossas previsões destacam os riscos associados ao relaxamento precoce ou rápido de NPIs (intervenções não farmacológicas). Embora as novas vacinas contra a SARS-CoV-2 ofereçam uma estratégia de saída potencial para a pandemia, o sucesso depende muito das propriedades precisas da vacina e da absorção da população, ambas as quais precisam ser monitoradas cuidadosamente”, dizem os pesquisadores.
Os cientistas usaram dados relativos ao Reino Unido para seu modelo, que avalia a interação do processo de imunização em diferentes cenários de relaxamento das medidas de controle para predizer o valor R (número reprodutivo de uma doença infecciosa), mortes e internações hospitalares entre janeiro de 2021 a janeiro de 2024.
“Nosso modelo sugere que a implantação da vacinação em adultos provavelmente não interromperá completamente a disseminação de casos de covid-19 no Reino Unido”, aponta Matt Keeling, da Universidade de Warwick, um dos autores do estudo, em uma nota.
Segundo ele, “uma liberação súbita e precoce de restrições provavelmente causará uma grande onda de infecções, enquanto o relaxamento gradual das medidas ao longo de muitos meses pode reduzir o pico de futuras ondas”.
Continuidade da restrição
No estudo, os especialistas sugerem que, mesmo após a vacinação, os governos continuem com as estratégias de prevenção, incluindo o uso de máscaras em ambiente de alto risco, a higienização das mãos, o distanciamento físico e social. Medidas de bloqueio, como o lockdown e o rastreamento de casos por meio de testagem, também são recomendadas de acordo com a situação.
“Embora a vacinação em massa inevitavelmente reduza a prevalência de doenças, outras medidas, como testes intensivos, rastreamento e estratégias de isolamento, serão necessárias para combater os focos de infecção. Manter baixos níveis de infecção é provavelmente a chave para o sucesso das estratégias de teste, rastreamento e isolamento e na redução do risco de escape da vacina”, aponta o estudo.
O biólogo Atila Iamarino endossou a necessidade de se manter isolamento social e medidas restritivas, sem relaxamento, mesmo após a vacinação. “Nós precisamos de um plano nacional de combate à covid-19. As vacinas serão fundamentais para salvar centenas de milhares de vidas. Mas sem um plano de medidas não-farmacológicas como readequação de espaços, educação da população, ainda vamos sofrer muito com o vírus. Saneamento básico, readequação de comércio e transporte, preparo do sistema de saúde e outras medidas somem sob a disputa de narrativas sobre vacinação e lockdown, mas serão fundamentais para sair da pandemia”, defendeu.
Isolamento em baixa
O estado de São Paulo completou, no último domingo (21), a primeira semana na chamada fase emergencial da quarentena, com medidas mais restritivas de circulação. Apesar do toque de recolher e as atividades esportivas e religiosas coletivas proibidas, o impacto em termos de isolamento social foi reduzido.
Segundo o Sistema de Monitoramento Inteligente do governo estadual, que coleta e analisa dados de telefonia móvel para indicar tendências de deslocamento, entre os dias 15 e 19 o índice máximo de isolamento social alcançado foi de 44%, percentual alcançado na terça e na quinta-feira. Nos outros três dias úteis, a marca foi de 43%.
Se há necessidade de manter o isolamento após a vacinação, a medida é mais necessária para quem só tomou a primeira dose. O médico infectologista Eder Gatti ressalta que a primeira dose não garante proteção imediata contra o vírus. Quando uma pessoa toma a vacina, seu corpo é exposto aos antígenos, substâncias que desencadeiam a produção dos anticorpos, em um processo que pode levar de duas a três semanas.
“Os estudos de eficácia das vacinas mostraram que nenhuma delas é 100% eficaz para evitar a infecção. A pessoa infectada, mesmo com duas doses, eventualmente pode se infectar. O risco é menor do que se não fosse vacinada, mas mesmo assim existe. Por isso mesmo, depois de semanas após a segunda dose, as pessoas devem continuar com as medidas de proteção, porque pode se infectar e infectar outras pessoas”, destaca o presidente da associação de médicos do Instituto de Infectologia Emílio Ribas.