Falta de emprego é maior entre jovens, mulheres e inexperientes
O desemprego brasileiro tem uma cara jovem, feminina, de média escolaridade e inexperiente. Para pessoas com essas características, a taxa de desocupação no Brasil é bem superior à taxa global de 4,7% registrada em dezembro do ano passado segundo o Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE). No último mês do ano passado, 1,1 milhão de pessoas estavam desempregadas nas seis capitais pesquisadas. Desses, 213 mil buscavam o primeiro emprego.
Karina Pereira, de 18 anos, é um exemplo desse perfil. Ela acabou de completar o ensino médio e está procurando o primeiro emprego. Karina gostaria de trabalhar como assistente-administrativo ou na área de informática, já que pretende começar neste ano uma faculdade de ciências da computação.
Encontrar um trabalho está entre as condições para cursar – e pagar – a faculdade. “Desde que me formei, meus pais, tios e amigos da família estão tentando me indicar trabalhos, mas até agora não encontrei nenhum. Estou ansiosa para começar”, diz a jovem, que foi ontem pela primeira vez a um Centro de Apoio ao Trabalho (CAT) em São Paulo montar o seu perfil profissional e buscar vagas disponíveis. Não conseguiu nada. A pretensão salarial de Karina é de R$ 1 mil, “mas acho que devo receber mesmo é R$ 900 no primeiro emprego”. Talvez a jovem esteja sendo muito otimista. Priscila Delphino, de Osasco, também tem 18 anos e procura o seu primeiro trabalho.
Ela já foi duas vezes ao CAT e ontem saiu com uma entrevista marcada para recepcionista de cinema em um shopping. O salário oferecido pela empresa é o mínimo (R$ 622), abaixo da sua pretensão (R$ 900). Entre as vagas compatíveis com o perfil de Priscila, essa era a única que não exigia experiência. Ela chegou a fazer ensino médio técnico em gestão de empresas, mas as oportunidades em recursos humanos, área de interesse da jovem, não consideram o curso técnico como experiência. Ela conta que menos de um terço da sua turma de 22 alunos conseguiu emprego até agora.
A taxa de desocupação entre as mulheres fechou o ano passado em 6%, mas entre os homens o índice é de 3,7%. Essa diferença é histórica, mas, segundo especialistas consultados pelo Valor, vem diminuindo. “Um exemplo desse fenômeno é a redução da oferta de empregadas domésticas. As mulheres [com menos qualificação] buscam empregos em serviços, sendo que a renda não é, necessariamente, maior, mas há a questão do status social e de o trabalho ser mais regulamentado, com condições mais claras”, afirma José Márcio Camargo, especialista em mercado de trabalho da PUC-Rio.
O pesquisador também aponta a falta de conhecimento sobre o novo profissional como um problema. “Há assimetria de informações entre a empresa que disponibiliza a vaga e o candidato que quer ser empregado. Oferecer um salário compatível com a produtividade do trabalhador em seu primeiro emprego é extremamente difícil”, diz.
Marcelo Neri, economista-chefe do Centro de Políticas Sociais da Fundação Getulio Vargas, relata assim a dificuldade do jovem: “Não tenho experiência, logo não consigo emprego; mas se não tenho emprego, não adquiro experiência”. diz. “Além disso, muitos não querem a mesma profissão dos pais. Filho de peão, peãozinho não é, pois eles já cursaram o ensino médio”, diz ele.
O desemprego no Brasil também é mais baixo entre aqueles com poucos anos de estudo (3,7%) ou aqueles com ensino superior (4,5%). Para quem tem entre oito e dez anos de estudo, o que significa ter concluído pelo menos o ensino fundamental e, no máximo, o ensino médio, a desocupação é de 7%.
Para Luiz Scorzafave, professor de economia da USP em Ribeirão Preto, há três principais hipóteses que justificam o desemprego maior entre as pessoas com nível escolar médio. “A quantidade de pessoas com nível médio incompleto está aumentando no mercado de trabalho e não há geração de vagas suficientes para essa qualificação. Além disso, como as pessoas estão estudando mais, a quantidade de postos de trabalho para pessoas com baixa escolaridade consegue atender a oferta. Finalmente, o número de pessoas com ensino superior está aumentando e elas têm um leque de opções maior. A pessoa com ensino superior pode exercer funções de quem tem menos qualificação. O contrário não é verdadeiro.”
Para Camargo, calcular a produtividade do candidato está entre as dificuldades que influenciam na taxa de ocupação do profissional com nível de escolaridade média. “Sobre o profissional mais qualificado, é fácil conseguir informações da qualidade da universidade cursada, por exemplo. No nível intermediário, não há informações disponíveis”, diz ele.
Apesar de o desemprego maior entre os jovens ser comum aos mercados de trabalho em todo o mundo, a falta de medidas que evitem o agravamento desse cenário pode trazer frustrações e atrapalhar o andamento da economia brasileira. Scorzafave alerta para o risco da informalidade. “Essa busca frustrada pelo primeiro emprego pode incentivar a informalidade. Um profissional relativamente qualificado pode aceitar se inserir de maneira mais precária no mercado de trabalho.”
O professor da USP-Ribeirão destaca a importância de investimentos para manter os alunos na escola e aumentar os anos de estudo. “Com mais tempo na escola, o jovem retarda a procura do primeiro emprego, entra no mercado mais qualificado e começa a contribuir com a previdência mais tarde, retardando a aposentadoria. São vários os aspectos positivos para o país”, destaca.
Do Valor Econômico