Festas de junho!

Nesta época do ano, ecos das festas juninas de Santa Rita DOeste, interior de São Paulo, costumam perseguir-me. Deixei a cidade onde nasci, próxima a Santa Fé do Sul, quase divisa com o Mato Grosso, em 1975, aos 16 anos. Na roça, as festas de junho eram as mais alegres. Busco na memória as razões para aquela alegria. Era uma vida difícil, um tanto modorrenta, muito trabalho na lavoura e, aparentemente, não tínhamos muito a comemorar.

Mas, à medida em que avançamos sobre este final de século, sinto mais falta daquela vida. Éramos felizes e não sabíamos… Hoje, mergulhado nesta dura realidade do Brasil e do ABC, consigo ver naquela região mais que o bucolismo e a nostalgia do passado. Nós todos, jovens e adultos, tínhamos, então, uma condição de vida – a oportunidade de trabalho – sem a qual, para lembrar Gonzaguinha, “o homem não é nada”. E isto faz a diferença.

Comemorar o quê? É o que me perguntava, na semana passada, enquanto organizávamos nossa festa junina na sede regional do Sindicato, em Diadema. Foi uma semana marcada por um telefonema, daqueles que nos tocam profundamente. Uma mãe, em prantos, relatava-me a situação da família, vivendo apenas da aposentadoria do marido. O mais pungente: a revolta do filho, que diz à mãe que não vai mais procurar emprego porque é perda de tempo. O mais triste: a dor da mãe ao revelar seu medo de que o filho decida partir para o assalto atrás de conseguir um toca-fita ou um CD.

A razão para o telefonema desesperado era a busca de uma notícia sobre as 700 contratações da Volks no ABC e em Taubaté. O menino candidatou-se mas não tinha sido chamado pela empresa para a entrevista. Nada podia confortar aquela mãe. Era difícil para ela entender de onde apareceram os 70 mil candidatos que estão disputando aquelas 700 vagas. Mais difícil ainda aceitar que o perfil da maioria destes candidatos inclui formação superior e experiência de muitos anos de profissão.

Em resumo: fruto do volume de desempregados, a indústria pode escolher a “cor dos olhos” do trabalhador a ser contratado. E, sem emprego, falta tudo, falta principalmente esperança. Falta motivo para acreditar que a economia pode estar retomando um pouco de fôlego. Que indicadores macro-econômicos mostram sinais de retomada do crescimento e que vale a pena continuar lutando para conseguir o emprego, apesar da falta de uma política econômica voltada para o desenvolvimento econômico e social.

Durante a década de 70, em pleno regime militar, quando vim para o ABC, a vida era difícil, mas a gente tinha a certeza do emprego. Aliás, aquela época , muitos de nós, os trabalhadores, eram quem escolhíamos a empresa para trabalhar. É verdade que o resultado do trabalho nem sempre vinha parar nas nossas mãos. Era a época em que se dizia que era preciso deixar o bolo crescer, para só depois poder fazer a sua distribuição. Mas, nós tínhamos esperança, e as festas eram animadas.

O bolo cresceu e o povo brasileiro conseguiu derrotar a ditadura militar que impedia sua divisão. Mas, eis que, assume o lugar dos militares uma nova casta de exploradores agora falando em nome do neoliberalismo e da globalização econômica. Cada qual por si, concorrência desenfreada, livre-mercado e mais uma série de mentiras cujo resultado aí está. O Brasil hoje está nas mãos de um Estado paralelo composto por quadrilhas de políticos bandidos como Luiz Estevão e pelo narcotráfico.

Mas, no meio desta poeira sufocante do Brasil real, há ainda sinais de esperança. Apesar de tudo, das dificuldades de sobrevivência e da violência generalizada que nos mantém reféns de nosso próprio medo, há sinais de resistência. O arrasta-pé das nossas festas juninas, com suas quadrilhas, seus noivos caipiras, a pipoca e o quentão mostram que não há nada no mundo capaz de vencer e derrotar a alma de um povo.

Luiz Marinho
Presidente do Sindicato dos Metalúrgicos do ABC