Governo zera IPI de carro que privilegiar produção nacional

MP beneficia empresas que aumentarem o conteúdo nacional e atende à indústria preocupada com importação de carros chineses e coreanos

 

Rossana Lana / SMABC

A indústria automobilística instalada no Brasil, composta exclusivamente de multinacionais, foi escolhida para receber o mais longo benefício da política industrial da presidente Dilma Rousseff.

Medida provisória publicada ontem vai permitir ao governo reduzir o Imposto sobre Produtos Industrializados (IPI) para as empresas que aumentarem o conteúdo nacional, elevarem investimentos e produzirem veículos inovadores. Hoje, a alíquota máxima do tributo é de 45%. O benefício vai durar até julho de 2016.

Segundo fontes da indústria automobilística, os veículos não vão ficar mais baratos, a exemplo do que ocorreu de dezembro de 2008 a março de 2010, quando o governo reduziu o IPI para incentivar o consumo durante a crise internacional. Pela nova medida, o governo vai abrir mão de parte da sua arrecadação, desde que a empresa apresente um projeto que envolva melhoria de competitividade.

“O dinheiro será carimbado, ou seja, a empresa só poderá se beneficiar se tiver um projeto aprovado pelo governo”, diz um executivo do setor. Ele ressalta, contudo, que as regras do plano, como porcentuais de redução e que tipo de projeto pode ser beneficiado, não estão definidas.

O estímulo inclui carros de passeio, comerciais leves, caminhões, tratores e ônibus, e não se aplica diretamente a empresas de autopeças. Segundo o coordenador-geral de Tributação da Receita Federal, Fernando Mombelli, as montadoras que cumprirem os parâmetros de inovação e uso de conteúdo local, que ainda serão definidos pelo governo, poderão ter uma “redução de alíquota (do IPI) de zero a 30 pontos porcentuais”.

Assim, o governo poderá, no extremo, zerar o IPI de 25% que hoje recai sobre os carros de passeio. “A medida do setor automotivo busca propiciar melhoria das condições competitivas dos fabricantes nacionais, concedendo benefício condicionado a certos requisitos”, disse Mombelli.

Coreanos e chineses. A medida atende a um forte lobby das montadoras que estão preocupadas com as importações dos automóveis coreanos e chineses. Como não há muito espaço para o uso de medidas de defesa comercial para conter as importações, os fabricantes pressionaram o governo para obter incentivos fiscais para carros “genuinamente brasileiros”.

A proposta da própria Associação Nacional dos Fabricantes de Veículos Automotores (Anfavea) sugere desoneração tributária para carros que atendam a índice de pelo menos 60% de componentes vindos do Mercosul.

A Argentina, vista pelo setor como um mercado complementar ao brasileiro, continua sendo o principal fornecedor de carros importados para o Brasil, mas já tem perdido mercado para os coreanos e chineses.

Embora a participação chinesa ainda seja inexpressiva, a Anfavea antevê que, em cinco anos, a presença dos carros chineses será “violenta” – nas palavras de uma fonte do setor – e atingirá o principal nicho das montadoras brasileiras, que são os carros mais populares.

Por outro lado, o governo quis acabar com a concessão de incentivos “gratuitamente”. Por isso, desta vez foi colocada uma contrapartida para forçar a indústria a inovar e tornar o País um polo de engenharia automotiva.

Técnicos dos Ministérios da Fazenda e do Desenvolvimento, Indústria e Comércio preparam as linhas do programa, como o porcentual de conteúdo nacional e as alíquotas de IPI. Não há prazo para a publicação de um decreto com as regras.

No primeiro semestre, de um total de 1,73 milhão de veículos vendidos no País, 390 mil (22,4%) foram importados, a maioria pelas próprias montadoras. As marcas que não produzem localmente trouxeram 90,4 mil automóveis no período.

Nas últimas semanas, algumas das marcas importadoras, especialmente as chinesas, anunciaram projetos de construção de fábricas no Brasil. A Chery está construindo uma unidade em Jacareí (SP), com investimento de R$ 640 milhões. A JAC Motors procura área para uma fábrica que terá aportes de R$ 900 milhões, metade bancado pelo empresário brasileiro Sérgio Habib.

Do Estadão