“Há muito tempo não se dialogava mais neste país”

Presidente do Sindicato, Moisés Selerges, destaca abertura dos diálogos com governos e Direção mais próxima à base com retomada do protagonismo da classe trabalhadora

Foto: Adonis Guerra

A luta pela consolidação da democracia dos Metalúrgicos do ABC segue forte com o projeto #ARetomada. O presidente do Sindicato, Moisés Selerges, aponta desafios e perspectivas para 2024, ano de eleições municipais que demandam atenta participação da classe trabalhadora. O retorno ao diálogo com o governo federal, democracia, ações voltadas à industrialização e geração de empregos também são temas desta conversa. Confira.

Quais os desafios dos Metalúrgicos do ABC para 2024?

Moisés Selerges – Depois do lançamento do programa Nova Indústria Brasil em janeiro, o Sindicato precisa garantir ainda mais debates sobre o tema, trabalhar para que essa política dê certo, fazer os ajustes necessários em relação ao emprego, à formação profissional, a questão do financiamento do BNDES (Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social) e cobrar medidas de economia para que a indústria retome a produção com geração de empregos.

Fale sobre os avanços positivos neste último ano?

Moisés Selerges – O que caracterizou nossa luta foi a volta dos diálogos com os poderes, seja estadual ou federal. Para que as políticas aconteçam é necessário a troca de informações já que há muito tempo não se dialogava mais neste país. Os sindicatos não tinham acesso aos poderes para expor suas propostas.

O que a base pode esperar para este ano?

Moisés Selerges – Empenho e dedicação da Direção do Sindicato, comprometimento nas reivindicações de interesse para nós trabalhadores, emprego, salários, melhores condições de trabalho e políticas. O Sindicato não abre mão de cobrar quem deve ser cobrado para que a vida dos trabalhadores e trabalhadoras melhore.

Como você avalia o debate no movimento sindical das 40 horas semanais?

Moisés Selerges – A jornada de trabalho no Brasil é de 44 horas, mas há algumas exceções, como na nossa região. Países vizinhos ao nosso já fazem jornada de 40 horas. Tem que criar uma discussão envolvendo trabalhadores, empresários e governo para que o país avance nesta questão, mas sem redução de salário. A redução de jornada tem um efeito positivo com a geração de empregos.

Qual o impacto do programa Nova Indústria Brasil na região?

Moisés Selerges – Recebemos esse anúncio de forma positiva. É uma medida correta, embora necessitem ajustes e isso é só por meio do diálogo. Dentre as observações, a questão das metas de emprego e formação profissional não apareceram. Qual é a participação da empresa no PIB? Queremos que saia dos 10% atuais para 15%, por exemplo. Acredito que isso deveria ser estabelecido como meta. Outra questão é o recurso do BNDES de R$ 300 bilhões anunciados. Temos que acompanhar para que o dinheiro chegue a quem vai gerar emprego e fazer a indústria crescer.

2024 é ano de eleições municipais para prefeitos e vereadores. Qual a importância da participação dos trabalhadores?

Moisés Selerges – São os trabalhadores que vão definir o futuro das cidades, por isso precisam estar mais ativos nesse processo. É a política que decide a saúde das nossas famílias, a escola dos nossos filhos. Temos que acompanhar esse processo, pois somos nós que produzimos a riqueza do país. Não podemos reclamar do preço do leite e votar no dono da vaca.

Qual a importância da democracia à sociedade?

Moisés Selerges – A democracia é a base da cidadania e segue como pilar para que a gente possa ter uma vida melhor. Sem democracia não há instituições, não há justiça, não há Sindicato. Sem democracia não há possibilidade dos trabalhadores participarem e construírem o futuro das próximas gerações.

Como você avalia os diálogos do movimento sindical com o governo federal? 

Moisés Selerges – O primeiro ano do atual governo federal foi de ajustes. Um ano para arrumar a casa e estabelecer crescimentos. O Sindicato foi recebido em todas as pautas que apresentou, mesmo que o governo não as tenha atendido como gostaríamos, mas não podemos negar que há diálogo com a classe trabalhadora, com os sindicatos e movimentos sociais. Agora cabe a nós, Metalúrgicos do ABC, lutar por nossas pautas. Como sempre digo, os sindicatos nasceram para questionar patrões e governos e isso a atual gestão tem claro qual é o papel dos sindicatos.

Como os Metalúrgicos do ABC avaliam o veto do presidente Lula à desoneração das empresas?

Moisés Selerges – A avaliação é positiva, já que todo benefício que se dá a algum setor tem que haver contrapartidas. Um exemplo é de uma montadora de carros instalada em São Caetano do Sul e São José dos Campos que se beneficiou dessa política, mas demitiu trabalhadores. Isso é dinheiro público, é dinheiro que deixa de arrecadar quando desonera a folha. É dinheiro que poderia estar indo para a saúde, para a educação.

Como é a relação do Sindicato com os movimentos sociais? 

Moisés Selerges – Só é possível construir a sociedade que queremos de forma coletiva. É importante o Sindicato dialogar com os trabalhadores do campo, com os que lutam por moradia, com os que lutam contra o preconceito, sobre a questão das mulheres. A nossa relação é de irmandade. Eu costumo chamar os amigos do MST (Movimento dos Trabalhadores Rurais Sem Terra) de primos porque eles chamam os Metalúrgicos do ABC de primos. Inclusive, o MST celebra 40 anos este ano e estaremos juntos na reforma agrária porque se o campo não planta, a cidade não janta.

O STF (Supremo Tribunal Federal) autorizou em 2023 a instituição da contribuição negocial para sindicatos por meio da celebração da convenção e/ou acordo coletivo. Como os Metalúrgicos do ABC entendem essa decisão?

Moisés Selerges – O STF percebeu que não existe democracia sem sindicatos fortes. Os trabalhadores têm que decidir a forma de financiar os seus sindicatos, que precisam disso para sobreviver. A decisão do STF acontece a partir da conquista de acordos, então não é algo impositivo como antes com o imposto sindical. Os sindicatos têm que produzir acordos que beneficiem os trabalhadores para que essa taxa seja colocada para os mesmos decidirem. É uma correção de rumo porque perceberam que se matam os sindicatos, matam também a democracia.

Qual recado gostaria de mandar aos trabalhadores e trabalhadoras da categoria?

Moisés Selerges – O Sindicato tem se dedicado muito à luta e ao projeto dos trabalhadores e em 2024 tem a obrigação de fazer mais do que fez no ano passado. Não abriremos mão das nossas engrenagens discutidas: estar muito mais próxima à base, discutir política industrial, formar novos quadros e retomar esse protagonismo com outros atores da sociedade.