Histórias da escravidão: Escravos abriam poupança para pagar alforria

O mais popular dos investimentos no Brasil, a caderneta de poupança, foi usada pelos escravos brasileiros comprarem sua liberdade. Depois da promulgação da Lei do Ventre Livre (1871), eles podiam abrir uma conta na Caixa Econômica para obter sua carta de alforria.

O Conjunto Cultural da Caixa Econômica Federal, em Salvador, abriu exposição de três destas cadernetas que revelam histórias muito interessantes e cruéis.

São documentos raros: existem apenas 85 delas. Isso porque Rui Barbosa, primeiro-ministro da Fazenda, ordenou que se recolhessem os documentos da escravatura para serem queimados no Rio. Isso foi em 1890, dois anos após a abolição. Ele quis apagar a escravidão da memória e livrar o governo de eventuais processos de indenização movidos pelos antigos donos de escravos.

História – Uma das poupanças é de Elvira, descrita na caderneta aberta em Cuiabá, em 1877, como “crioula (negra nascida no Brasil), escrava de João Cerqueira Caldas”, que inaugurou seu pecúlio com 50 mil réis. Fez vários depósitos até juntar 642 mil e 100 réis em 1884, quando encerrou a conta para comprar a carta de alforria.

Alguns senhores de escravos procuraram tirar vantagem da situa-ção. Um desses foi o tenente José da Silva Rondon, de Cuiabá. Ele incentivou a escrava Joana a iniciar o pecúlio em 1884. Até 1887 ela conseguiu amealhar 600 mil réis, que entregou ao tenente em troca da liberdade. Se tivesse esperado mais um pouco, Joana não teria o prejuízo: um ano depois veio Lei Áurea, lembrada ontem.