Ipea: política social no Brasil se aproxima da adotada pelos países europeus desenvolvidos
Mas, as políticas sociais precisam ser constantemente aperfeiçoadas uma vez que compõem uma área em construção contínua. E que, como tal, dificilmente deixarão de apresentar problemas
Ao analisar as políticas sociais adotadas ao longo dos 20 anos de vigência da Constituição brasileira, o Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada (Ipea) chegou à conclusão de que o país adotou uma política social bastante similar ao que foi feito pelos países europeus desenvolvidos no período pós-guerra.
A conclusão foi apresentada nesta quinta-feira (12) pelo diretor do órgão Jorge Abrahão. “Dá para afirmar que o Brasil já possui uma política social, ainda que ela tenha se aproximado tardiamente das políticas sociais da Europa”, disse Abrahão, durante o lançamento da publicação Políticas Sociais: Vinte Anos da Constituição Federal.
Com cerca de 1.050 páginas – abordando temas como seguridade social, previdência social, saúde, assistência social, educação, trabalho, cultura, desenvolvimento agrário, direitos humanos, acesso à justiça, segurança pública, igualdade de gênero e igualdade racial -, a publicação busca narrar todo o esforço brasileiro para construir a atual estrutura de políticas sociais do país.
Entre os avanços destacados por Abrahão, está a institucionalização dessas políticas. “Já é uma realidade que gerou inúmeros benefícios para o país o fato de contarmos com secretarias e ministérios com a estrutura montada e voltada para discutir promoções de tipo racial, de gênero, além das relativas a aspectos ligados à regionalidades, idade e direitos humanos”, argumentou o diretor do Ipea.
“São benefícios diversos e múltiplos fornecidos pelo estado, que inclusive ajudaram a aquecer o consumo da população, mostrando-se eficaz para o combate à crise, além de favorecer a diminuição da desigualdade e a universalização do ensino fundamental. Isso acabou formando um conjunto de bens serviços e de transferências sociais merecidos pela sociedade”, acrescentou.
Mas ele alerta que as políticas sociais precisam ser constantemente aperfeiçoadas uma vez que compõem uma área em construção contínua. E que, como tal, dificilmente deixarão de apresentar problemas. “Vem aí o problema do envelhecimento. Este é um problema que, como outros, e entre eles a mortalidade infantil, precisamos planejar bem a sua solução.”
Abrahão explica que a cobertura previdenciária precisa ser ampliada e que sua abrangência ainda está restrita à população urbana. Com o envelhecimento da população, afirma, aumentarão os custos previdenciários e isso causará impacto de forma a tornar necessária a adoção de novas formas e a contratação de mais profissionais.
“Isso não é para daqui a 100 anos, mas para daqui a menos de 20 anos”, adverte.
Segundo ele, ainda há muitos desafios sociais a serem enfrentados. “Na área da saúde é preciso assegurar a universalização e a integralidade e intensificar sua promoção. Na educação precisamos alcançar a universalização do acesso na educação básica e uma progressividade com qualidades. No âmbito da assistência social é preciso garantir o direito à renda e aos serviços básicos”, afirma.
“A diferença entre o que, no passado, era tido por assistência, então vinculada à primeira dama, e o que é atualmente, já representa um grande avanço em termos institucionais e culturais”, explicou o diretor. “Mas é importante ressaltar que, ainda na área de assistência social, a oferta de serviços é restrita e com focalização nos programas de transferência de renda.”
Ele chamou atenção também para a necessidade de se constituir um sistema público de emprego e de ampliar a distribuição de terra, implementando políticas integradas de geração de renda e inclusão produtiva. “A questão agrária, por sinal, está entre as que menos avançaram no país ao longo desses 20 anos”.
Abrahão sugere, ainda, a adoção de uma política coordenada nas áreas de saneamento básico, habitação, educação, renda familiar e cultura. “Trata-se de uma série de elementos importantíssimos para que tenhamos condições de mudar esse quadro.”
Essa mudança depende, segundo o pesquisador, diretamente da capacidade institucional do país “para identificar os problemas na localidade por meio de uma cultura de resultados, de forma a tornar possível e perceptível, não só para o gestor, mas para a população, avaliar como a ação pública está caminhando naquela comunidade.”
“Há uma baixa sinergia entre os entes federados, e este é um dos problemas mais graves para se pensar em eficiência, eficácia e na potencialização da ação pública, que ainda deixa muito a desejar.”
O Ipea avalia que faltam recursos para colocar em prática tantas políticas sociais. “Justamente por isso é importante que continuemos crescendo fortemente, para que haja recursos fiscais, porque não basta ter apenas recursos gerados”, argumenta.
“Há também falta de recursos humanos, como professorado, médicos, enfermeiros. Até porque há problemas gerados pelo próprio crescimento, como a falta de engenheiros e de outros profissionais que precisam ser ofertados pelo sistema educacional. Aliás, é fundamental que o sistema educacional caminhe nessa linha.”
Segundo ele, apesar de o Brasil contar atualmente com um ensino fundamental universalizado, “lamentavelmente de cada cem estudantes que entram, apenas pouco mais de 50 saem”. Abrahão lembra, ainda, que o Brasil possui cerca de 14 milhões de analfabetos. “Tudo isso vai precisar de muita energia, além de recursos públicos e capacidade humana de atuação”.
Da Agência Brasil