Mundo|Os Bafana Bafana querem o mundo

A África do Sul ainda junta os cacos do apartheid. Agora, corre atrás dos investimentos para abrigar a Copa do Mundo e, de carona, tentar tirar o país do atraso

Por Fred Ghedini
 

O número um
Apesar do fiasco de sua seleção nacional, os meninos da África do Sul
carregam o futebol no coração e o mantêm como esporte número um do
país. Como no Brasil, improvisam campos e praticam mesmo com
dificuldades

A partir de fevereiro, o técnico brasileiro Carlos
Alberto Parreira vai comandar os Bafana Bafana, como são chamados os
“garotos” da seleção nacional masculina de futebol da África do Sul. O
treinador da seleção brasileira tetracampeã, em 1994, nos EUA, e do
fiasco do ano passado, na Alemanha, tem um desafio monumental. “Os
Bafana Bafana saíram da última competição continental, a Copa das
Nações Africanas, sem marcar um único gol”, diz o especialista em
informação da Biblioteca de Estudos Africanos, da Universidade da
Cidade do Cabo (UCT, na sigla local), Colin Darch, 62 anos.

Para
ele, torcedor do Kaiser Chiefs, de Joanesburgo, o principal problema é
o baixo nível técnico dos times locais – já que os salários baixos
empurram os melhores jogadores para os clubes da Europa. As torcidas
vão muito pouco aos estádios. Assim como falta qualidade dentro dos
campos, a precariedade do transporte coletivo dificulta que o público
chegue a eles.

Esse é apenas um
dos problemas que o país que vai sediar a Copa do Mundo de 2010 terá de
superar. Parte da herança de quase meio século de apartheid, regime de
segregação racial imposto a partir de 1948 pelo Partido Nacional, da
minoria branca, hoje extinto. O regime, inspirado no nazismo, isolou o
país e o submeteu a um bloqueio econômico votado e decidido na ONU. E
só caiu depois de décadas de muita luta interna – com perseguições,
prisões e mortes – e pressão internacional.

Programada
para quase duas décadas depois do fim do apartheid, a realização da
Copa do Mundo é tida pelo governo e por muitos sul-africanos, como uma
oportunidade para promover melhorias em áreas críticas como
infra-estrutura, emprego e criminalidade.

Os
investimentos serão gigantescos. Apenas a construção ou reforma dos
nove estádios a serem utilizados está estimada em 4 bilhões de dólares.
Outros 5,5 bilhões devem ser destinados à infra-estrutura, com
melhorias nas estradas, nos sistemas de trens e nos aeroportos. Para o
transporte público urbano em particular, está previsto um plano de
investimento adicional de 3,5 bilhões de dólares no sistema de
minibus-taxi.

Os veículos –
semelhantes às lotações dos centros urbanos brasileiros – são o
principal meio de locomoção dos trabalhadores e das populações pobres
em todo o país, numa terra em que os brancos andam de carro, os trens
cobrem áreas muito pequenas, os ônibus urbanos são escassos e não há
metrô.

Oportunidade

“Meu
temor é que o investimento feito seja maior do que o que se receba em
troca”, questiona o professor da Escola de Saúde Pública e de Medicina
Familiar da UCT, Leslie London. Para ele, o país tem problemas
demasiadamente sérios, como a Aids, responsável por três em cada dez
mortes registradas, para se dar ao luxo de concentrar seus gastos em
eventos como a Copa do Mundo. Como o assunto já está decidido, London
resigna-se e acredita na capacidade de mobilização da sociedade civil
para tirar proveito da exposição internacional do país nos próximos
anos para forçar o governo a melhorar sua política nessa área.

Recentemente
a ministra da Saúde, Manto Tshabalala-Msimang, virou manchete em todo o
mundo ao defender o reforço na alimentação com alho, azeite de oliva,
beterraba e outros vegetais como principal ação na prevenção e
tratamento dos soropositivos. A Campanha Ação por Tratamento aos
Doentes de Aids (www.tac.org.za), movida em grande parte por milit