Não defendemos golpe, muito menos retirada de direitos

 

Reforma política deve ir além do sistema eleitoral
O debate sobre as mudanças do sistema político não pode ser desvirtuado por questões específicas como a simples alteração do sistema eleitoral. Esse foi o princípio que norteou o seminário sobre reforma política que a CUT promoveu nessa quarta (4), no Senado, antes do lançamento do seu 12º Congresso Nacional.
O embaixador brasileiro Samuel Pinheiro Guimarães ressaltou que uma das formas de manter a sociedade distante desse processo de discussão é convencê-la de que a atividade política é ruim, corrupta e corruptora e, assim, instá-la a não participar do processo político. Para isso, defendeu, é essencial o controle dos meios de comunicação
Moroni (com o microfone) afirmou que reforma do sistema político vai além de mudanças nas regras das eleições (Fotos: Roberto Parizotti)Moroni (com o microfone) afirmou que reforma do sistema político vai além de mudanças nas regras das eleições (Fotos: Roberto Parizotti)Outro passo é desmoralizar quem conduz o debate, como a organização dos trabalhadores. A partir daí, o próximo passo é financiar os representantes que querem ver no Congresso.
“Na reforma política a questão central é a o financiamento empresarial das campanhas contra o financiamento público. Porque essa é a fonte do sistema de controle político”, disse.
Para enfrentar o problema, há dois entraves: um deles está no Judiciário. O ministro do Supremo Tribunal Federal (STF), Gilmar Mendes, pediu vista há 11 meses do processo de julgamento da Ação Direta de Inconstitucionalidade (Adin) 4.650, proposto pela OAB (Ordem dos Advogados do Brasil), contra o financiamento empresarial de campanhas.
A medida visa segurar a conclusão da votação no STF (a derrota do financiamento empresarial é inevitável, já são 6 a 1 para o fim da participação das empresas) para que o Congresso decida.
Já o segundo entrave está justamente na PEC (Proposta de Emenda Constitucional) 342, do deputado Cândido Vacarezza (PT-SP), que mantém a doação das empresas para as campanhas.
Muito além da eleição
O professor José Moroni pondera que, apesar da importância de acabar com o financiamento privado, a reforma do sistema política não se resume às regras eleitorais. É preciso discutir essencialmente o poder. Ele lembra que o Congresso possui somente 6% de parlamentares jovens e, ainda assim, ligados a oligarquias.
Esse modelo, ao mesmo tempo reflete a formação de uma sociedade desigual e dá sustentação ideológica para a desigualdade. Apesar disso, é preciso enfrentar as ameaças imediatas, como o voto distrital e a PEC do Vacarezza.
“Temos que fazer a defesa do voto proporcional, porque o voto distrital ou misto destrói a representação dos grupos sub-representados. Será praticamente impossível uma mulher negra e lésbica ser a mais votada no distrito. Mas só isso, por si só, não cria outra correlação de forças para ter outro sistema político. Temos que nos colocar numa perspectiva mais radical para estratégia de ruptura. O básico da democracia direta é ela estar na mão do povo e dependemos do parlamento até para convocar plebiscito e referendo”, afirma.
O deputado Nilmário Miranda (PT-MG) alerta, porém, que a sub representação não pode ser confundida com o excesso de partidos.
“A sub-representação não é a defesa dos 28 partidos que temos hoje, muitos sem representar ninguém e que só servem para fazer negócio. É difícil propor uma reforma que organize isso, a saída, então, são as ruas para fazer avançar a democracia e permitir a luta de classes.”
Ele avalia que o voto uninominal faz com que a eleição parlamentar seja despolitizada. Como exemplo, cita as últimas quatro eleições presidenciais que terminaram com a vitória de candidatos do PT, mas sem que o partido elegesse maioria de parlamentares em nenhuma delas.
“Na Câmara dos Deputados não tem como mudar isso, o presidente (Eduardo Cunha) foi financiado por empresários e, dizem, ajudou a financiar vários outros deputados. Para ele, se tirar financiamento privado, acabou o poder”, definiu.
A reforma pelos movimentos
Integrante da secretaria operativa nacional do Plebiscito Popular por uma Constituinte para Reforma Política, campanha que arrecadou quase 8 milhões de votos, Paola Estrada destacou que nas últimas eleições a direita organizada colocou as mangas de fora como não se via há muito tempo.
Um dos reflexos, acredita, foi a eleição do presidente da Câmara, Eduardo Cunha (PMDB-RJ), que representa o lobby das empresas no Congresso. Para Paola, a tática das forças conservadoras é sangrar o governo, desgastar as ideias progressistas e se apropria da bandeira da reforma política, mas com o viés do financiamento empresarial.
Por isso, defende, não basta mais só falar de reforma política e sim dizer qual é a reforma que os movimentos sociais defendem.
“As forças conservadoras não estão preocupadas com o voto distrital, no fundo, o objetivo central é aprovar o financiamento privado de campanha, base do sistema corruptor em nosso país. Este momento é aquele que esperávamos, de acirrar a luta de classes para que a classe trabalhadora seja protagonista de sua própria história no Brasil. Sem resolver os entraves do sistema político, não conseguiremos tocar outras reformas como a agrária e da comunicação”.
Da CUT

Às 19h32 desta quarta-feira (4), horário de Brasília, a CUT iniciou o lançamento de seu 12º Congresso Nacional (CONCUT), no Senado. Conforme recomenda o protocolo em encontros como esse, organizações internacionais e nacionais de trabalhadores, além de ministros, estiveram presentes.

Miguel Rosseto (ministro da Secretaria-Geral da Presidência da República) e Manoel Dias (Trabalho) enalteceram a importância da Central para a consolidação da democracia, criticaram a tentativa de golpe que setores conservadores tentam viabilizar contra a presidenta Dilma Rousseff e apontaram conquistas dos últimos 12 anos.

Último a falar, o presidente nacional da CUT, Vagner Freitas, aproveitou a presença de representantes do governo para mandar um recado. Se por um lado a Central vai às ruas no próximo dia 13 em defesa dos direitos da classe trabalhadora, da Petrobrás, de democracia e da reforma política, por outro, não aceitará viver das vitórias passadas.

“Não fomos eleitos para falarmos do passado. Fomos eleitos para continuar conquistando e representando os trabalhadores. Não foi à toa que a CUT tirou em resolução apoiar a Dilma e eu não estou arrependido, porque o Brasil estaria arrebentado se o PSDB tivesse ganhado as eleições. Mas estou muito preocupado com esse início de governo e temos nos posicionado oficialmente quanto à condução da linha econômica que temos visto”, disse.

Sem retrocesso

Para Vagner, a presidenta o governo comete o erro de adotar a proposta derrotada nas últimas eleições. “Quero dizer para a Dilma que, além de ganhar eleições, tem de implementar a agenda do desenvolvimento e crescimento. Para que não tenha retirada de direitos, precisa retirar as medidas provisórias 664 e 665.”

Referindo-se à observação do ministro Manoel Dias, que apontou os dados divulgados em fevereiro sobre recorde nas baixas taxas de desemprego, o dirigente da Central fez um alerta. “No decorrer de sua trajetória de ministro, a cada dois meses, o senhor falou sobre a geração de empregos no Brasil. E o senhor fez uma intervenção aqui dizendo que dezembro teve a menor taxa de desemprego. Mas a comparação entre janeiro deste ano e janeiro do ano passado indica aumento. Para o senhor continuar dizendo que um dos grandes patrimônios que temos é o emprego, precisa mudar a política econômica. Porque estagnando a economia vamos chegar com desemprego no meio do ano muito maior do que temos hoje”, criticou.

Reajuste também para ricos – Vagner voltou a cobrar uma agenda positiva para os trabalhadores, com a discussão sobre o fim do fator previdenciário e a redução da jornada de trabalho sem redução de salário. Cobrou ainda que a tesoura do reajuste se volte também à taxação de grandes fortunas.

“O lado da CUT é a defesa intransigente da classe trabalhadora e sabemos que hoje isso significa também impedir o retrocesso. Uma coisa é discutir os rumos do governo, outra coisa é querer interromper, de maneira golpista, um governo democraticamente eleito pela maioria da sociedade brasileira”, acrescentou.

Vagner ainda respondeu à velha mídia que têm estabelecido uma comparação entre os atos do dia 13 e outras convocações pelas redes sociais para manifestações em defesa do impeachment da presidenta Dilma. “Os atos do dia 13 tem nome e endereço. É a CUT, a UNE, o MST, as centrais parceiras, os movimentos sociais e publicamos um manifesto para dizer quais as linhas da nossa luta. Os outros eu não sei quem convoca. Não se trata de defender governo ‘a’,’b’ ou ‘c’ e sim afirmar o posicionamento da CUT na conjuntura. Vamos fazer não só essa manifestação, mas muitas outras contra quem quiser privatizar a Petrobras, contra quem quiser abrir o capital da Caixa Econômica. Porque a abertura do capital da Caixa pode demonstrar uma inversão de política econômica no Brasil, vai abrir mão dos organismos públicos para investimento em políticas sociais. Com a Caixa privatizada, quem vai fazer o Bolsa Família e o Minha Casa Minha Vida?”, questionou.

Paridade vem aí

A vice-presidenta da CUT, Carmen Foro, e a secretária da Mulher Trabalhadora, Rosane Silva, lembraram que a Central está prestes a viver um período histórico, a implementação da paridade entre gêneros na direção.

Carmen ressaltou que a grandiosidade do tema impede qualquer possibilidade de retrocesso na decisão e Rosane ressaltou que uma organização democrática de trabalhadores exige o entendimento de que a classe trabalhadora é formada por dois gêneros.

Para além das fronteiras – Ex-presidente da CUT e atual da Confederação Sindical Internacional (CSI), João Felício, falou sobre o respeito conquistado ao longo de 30 anos de luta da Central em defesa da democracia e dos direitos trabalhistas e o secretário-Geral da Confederação Sindical das Américas (CSA), Victor Báez, avaliou que as políticas de austeridade impostas nas Américas pela direita, muitas vezes de maneira golpista, junto com multinacionais e os grandes meios de comunicação, são semelhantes à atual movimentação da direita brasileira.

Para a diretora do escritório da OIT (Organização Internacional do Trabalho) no Brasil, Laís Abramo, da mesma forma que seria impossível pensar avanços da classe trabalhadora e da democracia brasileira sem a Central, também seria impossível pensar a cooperação entre as organizações sindical Sul-Sul sem a atuação da CUT.

A responsabilidade de unificar

Nas intervenções de dirigentes da Força Sindical, CSB (Central dos Sindicatos Brasileiros), UGT (União Geral dos Trabalhadores) e Nova Central, a palavra liderança e unidade estiveram sempre presentes.

Para Antônio Neto, presidente da CSB, a CUT tem a responsabilidade de lidedrar o movimento sindical neste momento em que os direitos trabalhistas correm risco.

“A maior tem a obrigação e o compromisso de trazer para a unidade as outras centrais para enfrentarmos juntos o momento muito difícil. Estivemos lado-a-lado durante 12 anos e em três meses de mandato da Dilma parece que o Brasil está um casos. Caos coisa nenhuma, estamos é perdendo batalha de comunicação, este é o terceiro turno da direita que perdeu a eleição e quer ganhar no grito. E só a unidade da classe operária para enfrentar esse período.”

Para o secretário da Força Sindical, Sérgio Leite, foi justamente essa unidade que resultou em 19 projetos aprovados no Congresso favoráveis à classe trabalhadora, como a política de valorização permanente do salário mínimo, a isenção de imposto de renda sobre os lucros e resultados e a lei das trabalhadoras domésticas, ainda em fase de regulamentação.

Secretária de Relações Internacionais do PT (Partido dos Trabalhadores), Mônica Valente, acredita que o momento é de disputa ideológica e exigirá muita sabedoria para trazer à luta quem foi beneficiado por acesso ao emprego, à universidade e à casa própria por meio dos programas sociais implementados nos últimos 12 anos. 

“Neste momento, duas coisas são fundamentais, ter consciência de que há uma forte disputa pelo projeto político e que ao longo dos últimos quatro governos superamos as questões de partido, governo e sindicato. Cada um tem sua tarefa e mesmo projeto em comum”, definiu.

Reforma política

Tema de um dos seminários do dia, a reforma política foi lembrada pela presidente da UNE (União Nacional dos Estudantes), Vic Barros, como uma das pautas CUTistas para além do movimento sindical.

“A abertura do Congresso da CUT se dá no Senado, onde direita tenta colocar voto distrital e a Câmara tenta constitucionalizar adoção das campanhas pelas empresas. Se a direita quer debater corrupção nos também queremos e é fundamental para isso barrarmos a PEC (Proposta de Emenda Constitucional) 352, a PEC dos corruptores. E agora também completa um ano do pedido de vista pelo ministro do Supremo Tribunal Federal Gilmar Mendes sobre o julgamento da Ação Direta de Inconstitucionalidade da OAB (Ordem dos Advogados do Brasil), que questiona a doação das empresas para campanhas eleitorais. É fundamental reforçar o coro, devolve Gilmar!”

Para Rosseto, o Brasil hoje é um país melhor para a classe trabalhadora e isso é resultado da luta pelo povo em defesa da democracia, da República e pelos direitos. Na visão dele, essa batalha foi responsável por forjar a consciência política capaz de defender conquistas e compreender claramente a qualidade da disputa politica enfrentada no final do ano passado. “Foi a capacidade de liderança da CUT e das outras centrais que permitiu derrotar a direita conservadora e dar a vitória à companheira Dilma”, falou.

Já Manoel Dias acredita que a defesa da democracia, mais que uma bandeira é uma necessidade para a Central. “A democracia precisa ser mantida e conservada, porque quem mais precisa dela são os trabalhadores. É com a democracia que o trabalhador luta por seus direitos, propõe e reivindica. O melhor local para empreender a luta é a rua e só na democracia é possível usá-la como campo de batalha.”

Assista à reportagem da TVT sobre o evento: https://www.youtube.com/watch?v=-s1AuvVxGMY

Da CUT