“Não temos dúvidas de que somos contra a guerra”

Em reunião da direção executiva do Sindicato, o ex-ministro Celso Amorim apontou questões históricas e atuais sobre o conflito entre Rússia e Ucrânia

Foto: Adonis Guerra

O ex-ministro das Relações Exteriores nos governos Lula, o diplomata Celso Amorim, participou na última segunda-feira, 7, da reunião do Conselho da Executiva do Sindicato e explicou questões históricas e geopolíticas que levaram ao conflito e entre Rússia e Ucrânia. A guerra completou duas semanas ontem.

Confira os principais trechos:

Ataque é condenável

“As Nações Unidas proíbem o uso da força, a não ser, em dois casos específicos, quando julgar que o país é uma ameaça ao mundo ou quando o país age em legitima defesa. Mesmo que conste esse conceito de legítima defesa tem que ser visto de maneira restritiva. Todo ataque armado sem autorização da ONU que não seja em legítima defesa está errado. Não há como deixar de condenar essa ação. Não há dúvida de que o ataque russo à Ucrânia é condenável. Tanto que os países mais aliados, por exemplo a própria China, o máximo que fizeram foi se abster, com exceção da Coreia do Norte”.

Otan

“Pensadores políticos norte-americanos, até alguns mais conservadores, outros liberais no sentido americano da palavra, reconhecem que o que levou à essa situação foi uma atitude errada da Otan em relação à Rússia. A relação da Rússia com o Ocidente é extremamente complicada muito antes da existência do comunismo e da União Soviética. A Rússia foi invadida, de uma maneira ou outra, pelo Ocidente desde a Idade Média, e sempre o corredor principal é pela Ucrânia. A Otan é uma aliança em busca de um inimigo, que já não tem inimigo, pois não há comunismo e ela nasceu para conter o comunismo”.

Maior território

“A Rússia continua sendo o país com maior território no mundo, obviamente também com grande quantidade de recursos naturais e estratégicos, o gás e o petróleo, por exemplo”.

Conflito histórico

“A Ucrânia é um país complicado, muito dividido, ela é metade russa, metade ucraniana, mas não pode ser percebida como uma ameaça pelos russos. Ocorre que sucessivas administrações norte-americanas agiram no sentido contrário, curiosamente todas as democratas”.

Golpe de Estado

“Em 2014 houve um golpe de Estado na Ucrânia, em que o então presidente, considerado pró-Rússia, foi derrubado. Veio um novo governo muito pró-ocidental e a favor da incorporação da Ucrânia à Otan, isso se fortaleceu nos últimos anos com o governo Zelensky e também com Biden nos EUA. Essa expansão da Otan é o que gera instabilidade”.

EUA perdendo o controle

“Estamos vivendo um momento em que a potência hegemônica que é o EUA está perdendo seu controle sobre a situação e emergem outros países com grande poder, sobretudo China e Rússia cada vez mais alinhados. Quanto mais as atitudes ocidentais, sobretudo norte-americanas sobre a Rússia são hostis, mais ela se aproxima da China. Não estamos falando de uma aproximação qualquer, mas do país que tem o maior território do mundo, que é ainda sobre muitos aspectos a maior potência militar do mundo, isso muda muito a geopolítica, o quadro internacional.

Verdade é a primeira vítima

“Tem uma frase famosa que diz que na guerra, a primeira vítima é a verdade. Sobre a questão das usinas nucleares, a impressão que dava era que os russos estavam bombardeando as usinas nucleares com o objetivo de fazer um imenso desastre na Europa, e não era o caso”.

Intermediação

“Para buscar uma solução, é preciso um grupo de países. Em outra situação, o Brasil poderia até fazer parte, mas com o governo Bolsonaro isso é impossível. Neste momento o único país que acho que tem poder para parar a guerra é a China, porque é associado, evitou condenar a invasão e é crítica da Otan, além de ter poder econômico”.