“O Brasil levou tanto tempo para acabar com a escravidão e muito rápido começou a nos tirar direitos”

Na semana da Consciência Negra a Tribuna ouve homens e mulheres que lutam dia a dia contra o racismo em busca de uma sociedade mais justa e igualitária.

Na edição de hoje, confira o depoimento de Marina Inês do Nascimento, 56 anos. Ela começou a trabalhar aos 8 como babá e se aposentou como professora de língua portuguesa na rede pública às vésperas da aprovação da reforma da Previdência.

Hoje ministra oficinas de leitura com alunos do Ensino Fundamental e Médio, sempre com foco nas questões raciais e sociais. É dirigente da Apeoesp Diadema e militante do Grupo de Trabalho de Mulheres do Movimento Negro Unificado do ABC.

Foto: Divulgação

Reformas atingem em cheio as mulheres negras

“Nós mulheres negras, boa parte arrimo de família, em subempregos com salários menores, somos as mais afetadas neste desgoverno, todas as reformas que eles aprovaram nos atingem diretamente. Com a reforma trabalhista, as domésticas, por exemplo, na maioria mulheres negras que há pouco tempo conseguiram o direito de ter carteira assinada, praticamente perdem tudo. Depois veio a reforma previdenciária que acaba com a aposentadoria da mulher negra que trabalha no serviço pesado na periferia e não vai se aposentar nunca. O Brasil levou tanto tempo para acabar com a escravidão e muito rápido começou a nos tirar direitos”.

Representatividade no legislativo

“Vimos que nessa eleição foram eleitas mais pessoas negras buscando serem representadas e representar. Mas precisamos ficar atentos, porque sabemos que alguns esquecem das pautas sobre o povo preto. A mulher preta, indígena, trans que tem buscar o espaço nas câmaras municipais e nas prefeituras, porém muitas entram para atender ao patriarcado. Precisamos questionar se a mulher negra avançou para ser um número ou uma expressividade, uma resistência? É isso que temos que acompanhar no decorrer da vereança. Estar numa legenda que não atende às causas do povo preto é reforçar as questões do racismo na sociedade”. 

Bolsonaro abriu a ferida do racismo

“Bolsonaro transmitiu o ódio ao povo preto, abriu a ferida do racismo e do preconceito, quando, por exemplo, incentivou turistas a virem buscar mulheres aqui. No passado também fizeram de nós espécie para o turismo. Não somos só corpo, somos inteligência, somos capacidade e fazemos parte da transformação deste país que iniciou por nós povo preto e indígenas”.

Educação antirracista

“Não podemos deixar cair no conto de que a lei 10.639 (que estabelece a obrigatoriedade do ensino de “história e cultura afro-brasileira”) é pra ser trabalhada só pelo professor de história no mês de novembro. Essa lei é para ser efetivada e aplicada no decorrer do ano letivo e não somente dentro a escola, mas na rua, em casa, nas igrejas. Só assim vamos fazer o trabalho de resistência para mostrar o negro na sociedade enquanto construção de um país e não como escravos”.