O “espírito” do Natal
O dia demorava a passar. A ansiedade da antevéspera de Natal fazia seu coração disparar. Sentia uma angústia que não sabia explicar.
O alarme soou estridente. Paulo, esse era o seu nome, colocou lentamente as ferramentas no carrinho, pensou um segundo e deu no pé.
No vestiário não conversou, tomou uma chuveirada, enxugou-se, mergulhou para dentro das roupas e num piscar de olho já estava sentado no ônibus. A última poltrona da esquerda era o seu lugar costumeiro.
Reclinou o banco, deu bocejo e adormeceu.
Quando acordou já estava parado no seu ponto de descida. Saltou rápido e ao entrar em casa seu filho, correndo, veio ao seu encontro. Um abraço apertado, um beijo lambuzado e o menino lhe diz:
– Papai! Amanhã é Natal. Você já comprou o meu presente? Você me prometeu um videogame, meus amigos todos já tem. Ah! E minha irmã quer aquele celular novo que tira fotos. A gente vai comer um lanche lá no shopping, não vai? Aí a gente compra tudo não é?
Paulo sorriu, beijou o filho e falou:
– Vamos, sim. Vá chamar sua mãe, eu já estou pronto.
No carro a felicidade durou pouco. O trânsito não andava, milhares de carros se espremiam disputando o mesmo espaço, como se todos houvessem combinado o mesmo caminho e o mesmo destino.
As buzinas insistiam procurando passagem. Motoristas nervosos discutiam, gesticulavam, xingavam-se. O tempo foi passando. No banco ao lado a mulher calada, com olhar distante, parecia alheia a tudo aquilo. Na parte de trás as crianças começavam a ficar irritadas.
Finalmente chegaram. Para estacionar o carro foi outro sufoco.
Dentro do shopping a multidão disputava cada pedaço de chão, cada cadeira, cada produto, numa verdadeira batalha.
Paulo, aturdido, fechou os olhos. Ouviu alguém gritar:
– Relaxa, esse é o espírito do Natal.
Abriu os olhos e, diante daquela multidão, pensou:
O Natal mudou. Transformou-se no verdadeiro “espírito” do capitalismo.
Feliz Natal?
Feliz Ano Novo?
Departamento de Saúde do Trabalhador e Meio Ambiente