O gosto da reportagem

Para o premiado jornalista José Hamilton Ribeiro, as empresas de comunicação se aventuraram, meteram-se em crises financeiras e as redações pagaram o pato. Mas ele ainda acredita na volta da boa reportagem

Por Eugênio Melloni

Os
últimos tempos têm sido conturbados para o jornalismo brasileiro. A
crise financeira em que mergulharam os principais órgãos de imprensa
produziu maus reflexos nas redações. Cortes de pessoal, sobrecarga de
trabalho e redução de salários se tornaram corriqueiros. A produção
também foi afetada, com raros espaços para as reportagens de fôlego nos
jornais e revistas brasileiros, ocupados pela cobertura pasteurizada do
aqui-e-agora. Diante de um cipoal de adversidades e da crise de
credibilidade, pergunta-se: o jornalismo tem futuro?

Com
mais de meio século de dedicação ao garimpo de notícias, o jornalista
José Hamilton Ribeiro responde que sim. Para ele, os sinais alarmantes
emitidos por algumas redações são manifestações de um quadro de
turbulência passageira, que tende a ser superado. “O jornalismo está em
crise porque as principais empresas de comunicação se envolveram em
aventuras de investimentos fora da área, se deram mal e estão
endividadas”, explica. E a conta sobrou para as redações: “Há poucos
recursos e não há lugar para a grande reportagem”. Ele acredita que a
produção jornalística deve voltar a ostentar nível de qualidade melhor
que o atual na medida em que as empresas retomarem fôlego financeiro.

Em
detrimento da crise do jornalismo, os jornalistas melhoraram nesses
últimos 50 anos, acredita o repórter. Quando iniciou sua carreira, em
1956, na Folha de S.Paulo, espantou-se com o baixo nível do
recrutamento dos profissionais. Somente dois, entre dezenas, dominavam
o inglês. Até 1993, lembra, ainda existiam entre os associados do
Sindicato dos Jornalistas de São Paulo 23 analfabetos. Hoje, para ser
repórter, o sujeito precisa ter pelo menos quatro anos de universidade,
observa. E o domínio do inglês é corriqueiro. “A escola foi essencial
para essa transformação.”

Imbecis ou mal-intencionados
O veterano é ferrenho defensor do diploma universitário em Jornalismo
para o exercício da profissão: “Em um país como o Brasil, atrasado e
semi-analfabeto, quem é contra a escola, qualquer escola, ou é um
imbecil, ou mal-intencionado. A exigência de escolas para determinadas
profissões é um avanço, e uma exigência da sociedade”. Com o mesmo
rigor, empunha a bandeira da liberdade de imprensa e acredita que a
criação de um sistema de controle que evite abusos cometidos pela mídia
pode ser positivo, já que abusos por parte dos veículos comprometem a
liberdade e a credibilidade: “A sociedade precisa ter um mecanismo de
equilíbrio para evitar o excesso, a libertinagem”, avalia, alertando
que se a imprensa erra, mesmo que seja levada a se corrigir mais tarde,
pessoas e vidas podem ser destruídas.


Hamilton ressalta, contudo, que nenhum país obteve, ainda, êxito na
busca por um modelo de controle da imprensa. O problema desse tipo de
conselho é como assegurar total independência em relação a governos,
paixões políticas ou interesses econômicos. Zé Hamilton diz que o ideal
é um conselho constituído por jornalistas, mas reconhece que conseguir
estabelecer um modelo sem resultar em censura ainda é um desafio. “E a
censura não resolve o problema da imprensa. É o pior dos mundos”,
ensina.

Quanto à polarização
política, o repórter não acredita em jornalismo “olímpico”, imparcial:
“Mesmo se o jornalista tentar ser imparcial, a empresa para a qual ele
trabalha tem comprometimento filosófico, doutrinário, voltado para um
ou outro dos dois lados em que o mundo se divide. A imparcialidade é
uma quimera”.
Sobre a criação de uma rede pública de televisão,
Zé Hamilton acredita que os desafios a superar são: não pode ser
televisão para o governo falar bem de si próprio, senão, ninguém
assiste e quem assiste não acredita; e precisa conseguir coordenar a
rede de emissoras educativas e comunitárias já existente, cada uma