“O governo federal quer exterminar a população indígena que não tem condição de se manter dentro dos seus costumes neste momento”

Confira entrevista de um dos organizadores da frente que leva ajuda a essa população, abandonada na pandemia pelo governo Bolsonaro

Foto: divulgação

A epidemia de Covid-19 continua avançando entre os indígenas e já atinge 147 povos no Brasil. Ontem, na volta do recesso, o plenário do STF (Supremo Tribunal Federal) deu início ao julgamento da liminar que determina que o governo federal garanta atendimento de indígenas que estejam em áreas demarcadas ou não. Para a organização nacional indígena, manter a liminar é fundamental para evitar uma catástrofe maior.

Só no estado de São Paulo são 2.900 famílias que vivem em aldeias ou comunidades urbanas, um total de 10.050 indígenas. O último levantamento aponta que 808 já tinham sido infectados pela Covid-19 e 5 morreram, no estado, segundo a FAPIB-SP (Frente de Apoio aos Povos Indígenas do Brasil).

A Frente, formada no início da pandemia, por ativistas, indígenas e membros da sociedade civil, em parceira com o Programa Mesa Brasil do Sesc, foi criada para tentar suprir essa população, abandonada e atacada pelo governo Bolsonaro.

Um dos organizadores da Frente, o gestor ambiental e estudante de geografia, Edmilson Gonçalves dos Santos, conversou com a Tribuna para contar detalhes sobre a situação da população indígena no Brasil e sobre a atuação da FAPIB.

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Tribuna Metalúrgica – Como as restrições impostas pela pandemia afetaram e afetam as atividades econômicas dos indígenas?

Edmilson – Eles estão em um processo de isolamento dentro das aldeias, já que a saída pode levar o vírus para dentro da aldeia e afetar principalmente para os anciões. Eles vivem de três frentes, o ecoturismo, o artesanato e a agroecologia, e comercializam seus produtos com quem visita as aldeias. Com as visitas proibidas, a renda básica deles está comprometida.

TM – Como está atuação da FAPIB para garantir a segurança alimentar dessa população?

Edmilson – A nossa campanha ‘A fome não espera’ já forneceu cestas-básicas para 1.270 famílias no estado de SP e no sul do Rio de Janeiro, mas ainda estamos precisando de muita força, muita doação de recursos. Todos que participam das doações são treinados, equipados e testados e fazemos um processo rigoroso de higienização.

TM – Esse auxílio não deveria vir também do governo federal? Podemos dizer que hoje os indígenas vivem em uma situação de descaso por parte do governo Bolsonaro?

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Edmilson – O governo federal quer exterminar a população indígena, parece que voltamos para 1530 quando os portugueses chegaram aqui para colonizar o Brasil e trouxeram suas pragas e toda sua maldade. O governo federal fez uma única entrega para todo o estado de São Paulo com duas cestas-básicas por família. Eles acham que é possível viver com duas cestas por quatro meses. Isso é surreal. O que o governo federal está fazendo com a população indígena é genocídio, eles não têm condição nenhuma de se manter dentro dos seus costumes neste momento. A situação é muito preocupante e em termos de Covid-19, é ainda mais alarmante, a população indígena tem se contaminado muito mais na proporção de um pra um milhão do que a não indígena.

TM – Além do descaso, neste governo há um claro incentivo ao ruralismo, ao garimpo ilegal e às invasões nessas terras, o que prejudica ainda mais a situação, não é?

Edmilson – Em termos de território nacional fica pior. Desde o dia 1º de janeiro de 2019, quando o atual presidente sancionou o decreto tirando a Funai do ministério da justiça e mandando para o ministério da Damares (Ministério da Mulher, da Família e dos Direitos Humanos), já foi um afronte à população indígena. O incentivo ao ruralismo, às queimadas na Amazônia Legal e aos garimpeiros fazem com que haja cada vez mais invasão aos territórios indígenas e isso é preocupante, principalmente numa pandemia. A maioria da população indígena do Mato Grosso pra cima foi contaminada justamente por conta desses garimpeiros que entram no território indígena e levam os vírus pra lá.

TM – Teve também a situação em que Bolsonaro vetou a obrigatoriedade de fornecimento de água potável para as aldeias.

Edmilson –  No nordeste, onde o clima é árido, a população necessita de água, o governo federal tirou esse direito. Isso não existe em nenhum lugar do mundo, nenhum governo nega água a seus compatriotas. Na Amazônia Legal, muitos rios dentro de terras indígenas estão contaminados por conta do garimpo e do agronegócio, essa população também precisa de água.

TM – Como é feito o atendimento na área da saúde aos indígenas?

Edmilson – É feito através da Sesai, criada no governo Lula para prestar um atendimento mais humanizado, só que com as mudanças de governo ela foi perdendo a credibilidade.  Hoje a Sesai está sucateada, parte da sua gestão, os comissionados, coronéis e generais que não entendem nada de população indígena estão lá a mando do governo para dificultar as coisas. Já os servidores vêm sofrendo perseguição da chefia comissionada.

Para colaborar com a FAPIB-SP e ajudar mais indígenas entre em contato com o Instituto Akhanda: 96916-7914/ 96909-3101. www.institutoakhanda.com.