O pior passou?
Sim, segundo o ministro da Fazenda, Guido Mantega, que projeta até um saldo comercial maior para a economia brasileira
O ministro da Fazenda, Guido Mantega, concedeu por telefone uma entrevista à CartaCapital, na qual reafirma seu otimismo e acha que no último trimestre o País voltará a crescer a um ritmo de 4% ao ano. E comparou a atual situação da economia com a crise de 1998 enfrentada pelo governo Fernando Henrique Cardoso. “Se a nossa condição financeira fosse a mesma, estaríamos quebrados.” O ministro também falou das mudanças na poupança e da CPI da Petrobras.
CartaCapital: O governo vai enviar ao Congresso uma previsão de crescimento de 0,7% a 1% neste ano. Para muitos, ainda é uma avaliação otimista, ante as várias previsões de queda no PIB. Dá para apostar em expansão da economia?
Guido Mantega: Apesar da queda forte da atividade no último trimestre de 2008, o que contagiou o primeiro trimestre deste ano, temos sinais de recupe-ração. Um indicador, que acabei de obter, é animador. A inadimplência no Banco do Brasil começou a cair. Tanto no caso das pessoas quanto no das empresas. É um dado que reflete os últimos 60 dias. Portanto, no fim de março começou a haver uma recuperação. É muito difícil fazer uma previsão do PIB para 2009. Não só do PIB, aliás, mas de todas as outras variáveis econômicas. É um momento de grande volatilidade. Tanto é verdade que o Fundo Monetário e outros analistas têm reformulado suas previsões a cada quinze dias ou a cada mês. O que vejo é a consolidação de um cenário um pouco mais benigno e isso me leva a crer na possibilidade de ainda termos um PIB positivo em 2009. Sobre o relatório a ser enviado ao Congresso, é preciso dizer que ele cumpre outros papéis. Se fizermos previsões otimistas em demasia, abre-se espaço para maiores gastos nos ministérios. Temos de ser preventivamente conservadores. É melhor gastar menos que mais. É possível que a previsão seja de 1% e que, no último trimestre, o ritmo de expansão, anualizado, alcance 3% ou 4%.
CC: As empresas ainda reclamam muito do crédito. Ele continua caro e escasso. Apesar dos vários incentivos, o custo não caiu. Por quê?
GM: As empresas têm razão de reclamar. O crédito, de fato, não foi recomposto na sua plenitude. Existem setores com dificuldade de obter o financiamento necessário e as taxas continuam elevadas. Mas alguma coisa melhorou. Por exemplo, o crédito de automóvel voltou a ser concedido em 60 meses. No setor financeiro público, a oferta está se expandindo.
CC: E no privado?
GM: Há um bom nível de conservadorismo nos bancos. Eles têm preferido ficar em posição mais segura. Emprestar menos a taxas maiores. Mas, se a inadimplência estiver caindo em outros bancos como acontece no BB, talvez as instituições privadas se animem a aumentar a oferta de crédito. Além disso, empresas brasileiras voltaram a captar no exterior, ainda em escala incipiente, mas voltaram. Aí notamos a vantagem do Brasil, que tem conseguido se distinguir na crise. Está entre os menos afetados. Quando o mercado voltar a registrar alguma normalidade – neste momento voltar à normalidade total é praticamente impossível -, seremos um dos destinos preferidos dos investimentos. Já notamos uma entrada de capitais e acho que isso tende a crescer.
CC: Não tem sido resultado do apetite chinês por commodities? Esse aumento da dependência do comércio com a China não pode se tornar outro ponto de fragilidade?
GM: Os resultados da China são um bom sinal. Após cair por oito meses consecutivos, a produção industrial chinesa voltou a subir. Parece ter atingido o fundo do poço em março. É claro que eles têm papel fundamental no consumo de commodities, mas não existe uma expectativa de queda na atividade da China. Isso terá um impacto positivo sobre nossa balança comercial. Há quem preveja superávit de 30 bilhões de dólares neste ano. Antes se falava em 25 bilhões.
CC: O senhor considera que as medidas de estímulo do governo foram suficientes ou novas podem vir a ser adotadas?
GM: As medidas foram essenciais e tiveram bom resultado. Conseguimos reativar a demanda em setores diretamente atingidos pela crise, como a venda de carros. O programa habitacional também é muito promissor, pois visa estimular a demanda e as empresas estão se organizando para oferecer imóveis. O ponto mais crítico é o comércio internacional. Houve uma queda forte da demanda por produtos brasileiros. Mas o mercado interno continua em patamar elevado e tem garantido um certo nível de atividade.
Da Carta Capital