O Sindicato no chão da fábrica
O leitor tem acompanhado de perto nossa luta. Conhece a força e a posição de liderança dos metalúrgicos do ABC no conjunto dos trabalhadores brasileiros. Mas nada acontece por acaso. Quem nos acompanhou nestes 20 anos, em particular, é capaz de perceber que cada nova conquista foi fruto de muito trabalho, criatividade e abandono de todo e qualquer tipo de dogmatismo. Agora vamos dar novo passo nesta trajetória de construção da nossa cidadania. Esta é a boa notícia que tenho hoje.
Segunda e terça-feira próximas o Sindicato dos Metalúrgicos do ABC estará iniciando um processo eleitoral que renovará de forma significativa nossa estrutura de organização. A médio e longo prazo, a mudança se refletirá profundamente sobre a vida social, aprofundando a democracia sindical e fortalecendo os trabalhadores na sua relação com os demais atores sociais.
E como? Até hoje, todas as diretorias do nosso Sindicato foram escolhidas – a exceção das intervenções do período da ditadura – a partir de chapas de candidatos submetidas ao voto do conjunto dos associados. Desta vez vamos criar um turno eleitoral anterior a este processo tradicional. Durante esta etapa, que começa na Segunda e termina na Terça, vamos promover entre os associados de 69 fábricas, 69 diferentes pleitos eleitorais destinados a eleger um Comitê Sindical de Empresa em cada uma destas fábricas. Estes comitês serão instrumentos para ajudar a resolver no seu próprio nascedouro – com negociação e luta, quando for o caso – os problemas daquele chão de fábrica.
Do conjunto de cerca de 190 diretores eleitos na semana que vem – que comporão a diretoria plena – é que serão formadas uma ou mais chapas, compostas por 27 candidatos que concorrerão ao Conselho da Diretoria, incumbido de dirigir a vida do Sindicato. Nesta etapa, no final de maio e começo de junho, as chapas serão submetidas ao voto do conjunto de cerca de 80 mil filiados ao Sindicato dos Metalúrgicos do ABC.
E por que? A história das lutas operárias em todo o mundo tem sido uma seqüência ininterrupta de conquistas sociais que procuram afastar definitivamente da relação de trabalho as marcas da escravidão. Para nossa geração de trabalhadores, o primeiro passo foi, sob a liderança de Lula, vencer a ditadura fora e dentro das fábricas. A partir dali, em particular aqui no ABC, enfrentando o arbítrio das gerências e a repressão policial, nossa categoria jamais deixou de avançar em direção à conquista de sua cidadania.
Experiências como a da Câmara Setorial de 1992, como nossa participação na Câmara Regional do ABC, como a da suspensão das 2.800 demissões da Ford recentemente, ou como a criação das cooperativas que assumiram empresas em crise terminal na região, mostram que caminhamos muito desde a década de 70. A organização das Comissões de Fábrica em várias empresas da nossa base foram instrumentos fundamentais para o fortalecimento do nosso Sindicato e o amadurecimento de nossa ação.
Para nós, não basta apenas discutir reajuste salarial, embora a questão mereça toda a nossa atenção e o nosso empenho até porque a perda de poder aquisitivo do salário significa mais desemprego e recessão, drama que mais preocupa hoje nossa categoria. Nossa consciência de cidadania leva-nos a avançar sempre na busca de direitos fundamentais como a sobrevivência e a qualidade de vida. Daí nossa decisão de não abrir mão de nosso direito ao trabalho, que só poderá ser respeitado se conseguirmos fazer valer em todos os níveis da estrutura econômica – da empresa ao ministério da economia – os interesses dos trabalhadores que constituem a maioria da sociedade.
A novidade que inauguramos esta semana significará – na prática – levar nosso sindicato da porta para dentro da fábrica, habilitando-o com muito mais propriedade a participar e contribuir com a vida da empresa, da comunidade em que vivemos e com o próprio País. É o que entendemos por direito de cidadania