Opinião|A inflação e os interesses

Elevar os juros para desaquecer economia parece algo suicida. Por Sérgio Mendonça.

Por Sérgio Mendonça

O principal argumento das autoridades monetárias para a elevação da taxa básica de juros é de que é preciso conter a inflação. A taxa Selic, elevada para 11,75% ao ano em 16 de abril, estava em 11,25% desde setembro do ano passado. E desde maio de 2005 não subia.

As apostas do Banco Central são: elevando o preço do dinheiro os empréstimos ficam mais caros e esfriam o crédito e a demanda; as empresas reavaliam seus investimentos em produção, já que o retorno pode ser inferior ao das aplicações financeiras; se a demanda (procura por consumo) diminuir, os preços devem crescer menos ou cair. Enfim, com a economia em desaceleração, espera-se que a inflação fique bem comportada.

Cabe um reparo a essa decisão do BC. Na economia real, nem todos os preços oscilam conforme a lei da oferta e da demanda. A maior parte dos preços dos produtos e serviços levados em conta no cálculo da inflação só tem um caminho, o da subida. Nunca (ou quase nunca) caem. Nem quando a demanda cai.

Não há, nos últimos meses, altas generalizadas. Os preços de alguns alimentos (feijão, arroz, leite, carne, pão, óleo de soja, tomate, entre outros) subiram muito, é verdade. E eles afetam o cálculo da inflação. Contudo, os preços da maior parcela dos bens e serviços que compõem os índices de inflação (exceto alimentos) estão estáveis. Pelos cálculos do Dieese, cerca de 60% dos produtos e serviços estão com preços estabilizados há sete trimestres.

O trabalhador sabe o significado da inflação para o seu bolso. A inflação corrói o salário. Faz cair o poder aquisitivo. Portanto, não se trata de ignorar o efeito da elevação dos preços de alimentos essenciais no bolso do trabalhador. Essa inflação “de alimentos” talvez seja a mais perversa para os trabalhadores, especialmente para os que recebem salários menores. Causa a sensação (correta, diga-se de passagem) de que a inflação está muito alta!

O que não é razoável é atirar com bala de canhão para matar pomba. Desaquecer a economia, diminuindo o crescimento e a geração de empregos, olhando apenas para alguns preços, não parece uma medida sensata. Os preços de alguns alimentos até recuaram nos últimos meses. São os casos da carne e do feijão. O preço do arroz estabilizou.

Ensina a teoria econômica que certos preços sobem e descem conforme a oferta e a demanda. Em princípio, os produtos alimentícios são os que mais aderem a essa teoria. Na época de safra, os preços tendem a cair ou a se estabilizar. Na entressafra, a tendência é de elevação. Vejamos a aplicação prática da teoria. No plano internacional, há uma forte elevação da demanda de alimentos em função do maior consumo, sobretudo, dos países asiáticos, onde se destacam a China e a Índia. Esse movimento tende a elevar os preços.

Além disso, muitos produtos têm seus preços formados em mercados fora do Brasil – caso da soja, do trigo, do milho, do arroz, do açúcar, algodão, entre outros – sem seguir necessariamente essa lógica. E há, ainda, um fenômeno recente na formação desses preços nos mercados internacionais.

Há indícios de que os fundos que hoje comandam a globalização financeira estão especulando com os mercados de alimentos em função da desvalorização do dólar e da busca frenética por ganhos para suas carteiras. Como alguns produtos estão com estoques muito baixos, os movimentos especulativos estão produzindo elevação dos preços desses produtos.

O que o nosso Banco Central pode fazer contra esse movimento? Nada, ou quase nada. Assim, elevar juros básicos para desaquecer a economia e enfrentar uma inflação localizada parece uma política suicida. Pode colocar em risco o atual crescimento da economia e da geração de empregos.

Seria razoável aguardar mais tempo observando o comportamento dos preços dos alimentos, já que os demais preços internos estão estáveis. A não ser que outros interesses de segmentos financeiros que serão beneficiados imediatamente pela elevação dos