Orçamento de 2021 passará por “acordo político” para ser sancionado
Despesas obrigatórias foram encolhidas e emendas parlamentares, infladas, gerando "contabilidade criativa"
O Congresso Nacional e a equipe econômica do governo de Jair Bolsonaro entraram em um “acordo político” para definir cortes e manutenções do Orçamento de 2021, aprovado pelos parlamentares em 21 de março, segundo a nova ministra da Secretaria de Governo, Flávia Arruda, em declaração ao jornal O Globo.
As mudanças deverão ser feitas por meio de vetos ao texto, mas não se sabe ainda se o ajuste de valores será feito por meio de vetos do próprio presidente ou do Congresso Nacional.
De qualquer maneira, há consenso entre os políticos e a área técnica sobre a necessidade de manter a proposta orçamentária dentro das regras fiscais.
O caminho mais provável de ser escolhido é o veto a emendas parlamentares, instrumento pelo qual deputados e senadores destinam valores do Orçamento para os projetos que consideram prioritários. O Congresso já concordou, estabelecido o acordo, em cortar pelo menos R$ 13 bilhões em emendas.
Aumento de verba para programas de interesse para Bolsonaro
Somente a verba destinada ao desenvolvimento regional – ponto estratégico a Bolsonaro tendo como perspectiva a eleição presidencial de 2022 – aumentou em 647,5% em relação à verba do projeto enviado em agosto aos parlamentares: de R$ 1,728 bilhão para R$ 12,919 bilhões.
Outras áreas consideradas de interesse do presidente também tiveram o orçamento inflado após acordos partidários no Congresso. Os programas ligados à proteção à vida e fortalecimento da família receberam um aumento de 154,1%, saindo de R$ 132 milhões em agosto de 2020 para R$ 336 milhões.
De um lado, para aumentar a verba de emendas parlamentares destinadas principalmente ao desenvolvimento regional, foi necessário diminuir o outro lado do cobertor.
Retirou-se, portanto, o dinheiro de despesas obrigatórias, como aposentadorias e outros benefícios da seguridade social, bem como diminuiu-se o orçamento de programas ligados à conservação e uso sustentável da biodiversidade e dos recursos naturais (23,4%); inserção econômica no cenário internacional (16,1%); mudança climática (7,9%); transparência, integridade e combate à corrupção (2,9%); e agropecuária sustentável (1,7%).
Tanto de um lado quanto do outro do cobertor, no entanto, a conta não fecha, se levado em consideração o teto de gastos e a política de austeridade do governo federal em relação aos gastos sociais.
A diferença da previsão de despesas aumentou cerca de R$ 20 bilhões entre a enviada em agosto aos parlamentares e a aprovada em março.
Crime de responsabilidade e impeachment podem entrar no horizonte
Ainda que o orçamento geralmente seja analisado pelo Tribunal de Contas da União (TCU) somente após a publicação no Diário Oficial da União (DOU), o Orçamento de 2021 já foi parar no TCU, mesmo sem ser sancionado ainda por Bolsonaro.
Por ter diminuído o volume das despesas obrigatórias, que representam 95% de todo o orçamento federal, “sem justificativa técnica robusta”, de acordo com o Tesouro Nacional, o Orçamento cria uma “contabilidade criativa” ao extinguir despesas que não podem simplesmente ser canceladas.
No total, o Congresso transferiu R$ 26,45 bilhões das despesas obrigatórias para as emendas parlamentares.
Os outros 5% do orçamento são as despesas discricionárias, que são justamente os investimentos com infraestrutura. Com o teto de gastos, no entanto, 5% não são suficientes para financiar os projetos bolsonaristas.
Essa má-gestão financeira pode, no entanto, levar ao temido crime de responsabilidade fiscal e, consequentemente, ao impeachment.
Por isso, a equipe econômica do governo corre para diminuir o orçamento. Um crime de responsabilidade pode ocorrer somente a partir da execução dos pagamentos, e não a partir da sanção do projeto.