Pequim adota lei que prevê indenização por acidente de trabalho

Chineses poderão reivindicar danos ilimitados contra empresas, porém corte devem continuar limitando valores em casos com muitas vítimas

 A China tem se adaptado com prazer aos costumes do mercado financeiro, inclusive à ferramenta predileta do capitalismo, o processo judicial.

Desde a última quinta-feira, os chineses têm uma nova lei de prejuízo, que dá a eles direitos significativos, incluindo a possibilidade reivindicar danos ilimitados contra empresas que os prejudicam.

Os chineses também poderão processar por estresse psicológico, prejuízo ambiental, e até difamação pela internet.

Isso é suficiente para botar medo em corporações ocidentais, especialmente num momento em que a ampliação de direitos trabalhistas na China está aumentando o custo do trabalho.

Empresas ocidentais receberam a nova lei como sinal de que o governo chinês está levando a sério a criação de uma cultura jurídica no país.

A nova legislação surge logo após a implementação de novas leis trabalhistas e de leis de propriedade intelectual e falência. Mas ninguém quer ver a China introduzir processos ao estilo americano, completo e com indenizações estratosféricas.

No curto termo, empresas provavelmente tem pouca razão para se preocupar.

“Eu não antecipo grandes recompensas no futuro próximo”, diz Eugene Chen, do escritório de advocacia Hogan Lovells, de Pequim. “A lei deixa uma margem para o aumento de recompensas ao deixar de impor limites nas indenizações, e introduzindo o conceito de que dinheiro pode ser usado para punir transgressões, e não apenas como compensação.”

Mesmo antes da nova lei entrar em vigor, os chineses recorriam a um sistema de defesa difuso contra casos de prejuízos.

Esses casos dominam o sistema de litígio, mas a compensação é geralmente baixa.

“Indenizações são severamente limitadas, geralmente por causa do pensamento estabelecido, não por causas das leis em si. As cortes chinesas simplesmente não veem a perda de uma mão como sendo grande coisa”, diz outro advogado americano que preferiu ficar anônimo.

As cortes devem continuar limitando as indenizações, e grandes casos envolvendo muitas vítimas – como o escândalo do leite estragado que, em 2008, afetou milhares de crianças – provavelmente nunca irão aos tribunais. Os pais das crianças não puderam abrir processos.

Na China, são os políticos quem decidem o que vai para a Justiça, e a nova lei não pode mudar isso.

Mesmo assim a lei deve causar uma explosão nos processos de litígio, e dará à população um novo canal para solucionar disputas fora do sistema político.

Junto com a aprovação ocorrida há dois anos de uma lei trabalhista que ajuda trabalhadores a combaterem empregadores abusivos, a lei de litígio irá encorajar uma cultura de direitos individuais, e poderá agir como uma válvula de escape para pressões no sistema político, avaliam com especialistas.

Wang-Pu, de 10 anos, e seu pai, Wang Maoqing, estão prontos para aproveitar a nova regra: eles planejam abrir um processo de 60,000 yuans (US$ 8,8 mil) contra a escola de Wang-Pu, onde ela escorregou e quebrou dois dentes.

O pai da menina diz que a escola se recusou a assumir responsabilidade pelo acidente, e ele acredita que a nova lei irá o ajudar a conseguir uma compensação. E a julgar pela mídia chinesa, ele está longe de ser o único a entrar na fila para abrir processos de litígio.

Empresas estrangeiras que ignoram esses processos se arriscam, de acordo com Eugene Chen. Mesmo antes da lei passar, a demanda por indenizações estava crescendo, especialmente quando os casos envolviam empresas estrangeiras.

“A quantidade de dinheiro sendo exigido não pode ser mais ignorada pelas empresas. Os requerentes estão agora exigindo quantidades enormes, de milhões de yuans”, diz ele.

No longo prazo, isso só pode aumentar o preço de fazer negócios na China.

 

Da redação com Valor Econômico