Plebiscito pela reforma política passa por ajustes finais
Movimentos consideram que principal reivindicação das manifestações de junho segue em aberto
Expectativa de 400 entidades é de conseguir aproximadamente 10 milhões de votos na consulta em apoio à mudança no atual sistema político-eleitoral. Resultados serão levados ao Congresso e ao STF
Aproximadamente 400 entidades da sociedade civil organizada de todo o país preparam, para o período entre a próxima segunda-feira (1º) e sexta-feira (7), a chamada Semana Nacional de Luta pela Reforma Política Democrática, que terá atos públicos e a coleta de votos e assinaturas para o plebiscito popular – no qual o povo dirá se quer ou não mudanças no sistema político brasileiro. As ações também serão feitas pela internet, de forma a contar com a adesão de pessoas que não possam participar das votações nos lugares especialmente montados para este fim.
Dentre os temas a serem abordados estão a discussão sobre financiamento de campanhas, mudanças no sistema eleitoral, maior participação social nas políticas públicas do país, o fortalecimento dos mecanismos de democracia direta e maior representatividade de grupos considerados subrepresentados no sistema político e nos espaços de poder – tais como mulheres, negros e indígenas, entre outros.
Para definir as principais diretrizes das ações conjuntas que invadirão o Brasil a partir de segunda-feira, representantes de várias destas entidades, dentre as quais Ordem dos Advogados do Brasil (OAB), Conferência Nacional dos Bispos do Brasil (CNBB), Movimento dos Trabalhadores Rurais Sem Terra (MST) e a Central Única dos Trabalhadores (CUT) divulgaram esta tarde, em Brasília, o plano de trabalho da mobilização.
Na prática, o plebiscito consultará os brasileiros sobre a convocação de uma assembleia nacional constituinte para fazer a reforma política. Ao todo, conforme os organizadores desse movimento, já estão organizados em mais de cem municípios 1.500 comitês, com estrutura preparada para ouvir a população por meio da disposição de urnas e cédulas. A expectativa é de que sejam recolhidos aproximadamente 10 milhões de votos. Além disso, a votação via internet será colocada à disposição pelo site do movimento, organizado com um sistema que impedirá que uma mesma pessoa vote mais de uma vez.
Coleta de assinaturas
Em paralelo a esse trabalho, as entidades envolvidas na ação farão a continuidade da coleta de assinaturas para o projeto de lei de iniciativa popular pela reforma política, que está sendo realizada pelo Movimento pelas Eleições Limpas desde o ano passado. É necessário 1,5 milhão de assinaturas para que a matéria seja encaminhada ao Congresso Nacional e possa, finalmente, ter iniciada sua tramitação (sendo que, deste número, mais de 400 mil já foram recolhidas).
O projeto está sendo estruturado dentro do mesmo modelo que resultou na chamada Lei da Ficha Limpa. Estabelece, em seu teor, que o financiamento das campanhas passe a ser exclusivamente público ou feito por doações de pessoas físicas, que as eleições passem a ser proporcionais e realizadas em dois turnos, e que haja paridade de gênero nas listas de candidatos. Também propõe o fortalecimento de mecanismos de participação popular direta, como plebiscitos e referendos no país.
“São duas frentes de trabalho a serem deflagradas: a primeira, o plebiscito em si para a realização da constituinte. O segundo, a coleta de assinaturas para o projeto de iniciativa popular pela reforma política. Ambos têm o mesmo objetivo. Temos consciência de que, se não pressionarmos, o Congresso Nacional não fará essa reforma. É vantajoso para os parlamentares o atual sistema, onde impera o poder econômico despejando rios de dinheiro nas campanhas a cada ano eleitoral”, disse o advogado Fábio Mesquita, da OAB.
‘Mais participação’
O secretário-adjunto de Relações do Trabalho da CUT, Pedro Armengol, chamou a atenção para a influência do poder econômico no processo eleitoral, o que segundo ele prejudica candidaturas populares. Armengol destacou que a central apoia a realização de reformas como a tributária e a do sistema de comunicação, mas para que tais reformas aconteçam é fundamental que, antes, o Brasil passe pela reforma política. “Sem a reforma política, não tem como as outras avançarem”, frisou.
Para o bispo Dom Joaquim Mol, que representa a CNBB, a semana de atividades é importante para marcar a ampliação do movimento e o aprofundamento da democracia no país. O religioso destaca a importância a ser dada pela busca por maior espaço entre os grupos tidos como subrepresentados. Citou como exemplo o fato de as mulheres, atualmente, terem menos de 10% de assentos no Legislativo brasileiro como um todo. “Nós queremos participar mais. Queremos que o povo ajude a tomar as principais decisões no nosso país”, disse.
Um dos coordenadores da campanha pelo plebiscito popular, o advogado Ricardo Gebrim lembrou ainda que a iniciativa foi sugerida em junho do ano passado pela presidenta Dilma Rousseff ao Congresso Nacional, logo após as manifestações populares, e depois deixada na gaveta por deputados e senadores, encabeçados pelo PMDB, que controla as duas casas e a vice-presidência da República. De acordo com Gebrim, a reforma política é o principal ponto reivindicado pela população nos atos de junho. No entanto, foi um dos poucos temas a não ter tido andamento – apesar de toda a discussão observada nos últimos meses.
O secretário-geral da OAB, Cláudio Pereira, aproveitou para falar sobre o desequilíbrio existente no sistema eleitoral. Pereira enfatizou que as distorções são “incompatíveis com os anseios do nosso povo”. Conforme acrescentou, 95% das doações para campanhas eleitorais saem de empresas da iniciativa privada. Além disso, apenas 7% dos deputados federais são eleitos com os próprios votos, os demais 93% são eleitos mediante votos puxados das coligações às quais pertencem. “Precisamos de um sistema mais transparente, que permita ao eleitor ser, de fato e de forma efetiva, o senhor da sua decisão”, colocou.
O trabalhador rural Valdir Misnerovicz, que participou da coletiva representando o MST, foi outro a destacar a importância da mobilização. Ele salientou que, se não houver qualquer mudança que leve a uma reforma política no país, “também não serão observados avanços em conquistas para os principais problemas da sociedade”.
Os resultados do plebiscito serão apresentados, ao final dos trabalhos, ao Congresso Nacional e ao Supremo Tribunal Federal (STF). Foi divulgado que todas as informações sobre a semana nacional que começa segunda-feira, assim como os locais dos comitês localizados mais próximos de cada cidadão. Serão oferecidos no mesmo site em que as pessoas também poderão fazer suas votações.
Da Rede Brasil Atual