Política industrial depende de ousadia sindical, diz secretário de Desenvolvimento de São Bernardo
Jefferson Conceição afirmou que o país precisa de sindicalismo mais agressivo |
O mesmo movimento sindical que, na década de 1970, se levantou para exigir melhores condições de trabalho e questionar o autoritarismo nas fábricas e, nos anos 1980, colocou em pauta o papel cidadão do sindicato, ao ir além dos assuntos do trabalho, precisa se rearticular para pressionar o governo por uma política industrial nacionalista e de longo prazo. |
Para o secretário de Desenvolvimento Econômico, Trabalho e Turismo de São Bernardo do Campo, Jefferson Conceição, o Brasil perde estrutura sindical também por falta da agressividade que os sindicatos tiveram no passado. “A crise é mobilizadora e pode ser um celeiro de inovações, inclusive nos sindicatos”, defendeu.
Essa rearticulação citada por Conceição é o objetivo da CUT com a reorganização dos ramos da Central dentro de macrossetores. O da indústria promove, nesta primeira semana de dezembro, um curso de capacitação para conselheiros em políticas industriais nas esferas federal, estaduais e municipais. O curso está sendo realizado na sede da Confederação Nacional dos Metalúrgicos da CUT (CNM/CUT).
Nesta quarta-feira (3), segundo dia do encontro, o secretário de São Bernardo do Campo ressaltou a importância da contribuição da classe trabalhadora na elaboração de políticas públicas ao citar um acordo no setor automotivo, em 1992, dentro de uma Câmara onde o movimento sindical propôs o conceito do carro popular. Apesar do sucesso do debate, o espaço acabou em 1994 por decisão do ex-presidente Fernando Henrique Cardoso (PSDB).
“Temos capacidade de organização, de mobilização e de proposição e precisamos discutir espaços nacionais, mas com um recorte regional, cruzando territórios e setores, que denominamos APLs (Arranjos Produtivos Locais). Será nesses espaços que discutiremos qualificação profissional, como atrair trabalhadores para os setores, o financiamento das empresas em dificuldade. Dá para ter uma agenda com interesses setoriais e gerais”, definiu.
Para Conceição, a inovação está atrelada à qualificação profissional e, para isso, o investimento no Pronatec (Programa Nacional de Acesso ao Ensino Técnico e Emprego) é fundamental. Assim como a aproximação entre os trabalhadores e as universidades, não apenas como parceiros para formar trabalhadores qualificados, mas também para elaborar proposições conjuntas.
O secretário ainda lembra que é preciso que o movimento sindical cobre da presidenta Dilma Rousseff a nacionalização crescente da indústria, atrelada à ampliação do investimento em educação como forma de garantir empregos de qualidade.
“A pauta da inovação tecnológica deve ser incorporada pelo movimento sindical, que precisa cobrar também a aplicação dos royalties do pré-sal destinados à educação como indutor da qualificação profissional, especialmente para setores de petróleo, gás, defesa e saúde, para os quais há projeção de investimentos gigantescos”, disse.
Em um balanço sobre a retomada da política industrial na última década, Conceição acredita que boa parte dos avanços nos próximos anos depende da capacidade da classe trabalhadora manter o papel de protagonista. “Deixamos para trás a época do governo Fernando Henrique, quando o mercado ditava os rumos da indústria brasileira. Agora, os sindicatos precisam continuar em defesa não apenas dos trabalhadores, mas também da soberania brasileira.”
Papel do Estado
Na apresentação de Leandro Horie, economista e técnico do Departamento Intersindical de Estatística e Estudos Socioeconômicos (Dieese), foi destacada a estruturação da indústria que deve partir do governo federal, porque os empresários brasileiros, ao contrário do que ocorre em outros países, não estão interessados em construir uma cadeia forte e inovadora. “Hoje você observa a produção caindo e o faturamento aumentando porque importam para aumentar o lucro.”
O técnico do Dieese lembrou que o desenvolvimento industrial brasileiro está atrelado à ação do Estado desde a década de 1930, período em que o governo de Getúlio Vargas substituiu a então cultura cafeicultora pela indústria. Conforme observou, enquanto os países ditos centrais demoraram 200 anos para promover a industrialização, o Brasil fez o mesmo em 50.
“Chegamos ao final da década de 1980 com praticamente a mesma estrutura da Alemanha, época em que vendíamos carro e máquinas para a Coreia. É importante lembrar isso para ver como a indústria brasileira se deteriorou até 2004, quando o governo Lula resolveu retomar as discussões sobre a reestruturação”, explica.
Estrutura parecida, mas não idêntica, lembrou o professor de Economia da PUC-SP, Miguel Huertas. “Tínhamos uma indústria diversificada, mas tecnologia antiga. Nos Estados Unidos, os chips, começaram a ser feitos em 1970. No Brasil, a primeira fábrica de chips foi criada em 2012”, lembrou.
Para Huertas, outro problema é a concentração de indústrias de inovação nas mãos do capital estrangeiro. “A maioria das empresas no Brasil é reprodutora de tecnologias. E as poucas inovadoras que surgem são compradas por estrangeiros, a exemplo da Datamec (empresa pública de processamento de dados ligada à Caixa Econômica Federal, privatizada pelo governo FHC)”, disse.
Metas e gargalos
Para Leandro Horie, o Plano Brasil Maior teve, entre os principais acertos, medidas conjunturais como a determinação de preferência dos produtos nacionais nas compras do governo federal; a utilização do BNDES (Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social) para financiar o crescimento e a abertura, ainda que limitada, para a participação do movimento sindical.
Segundo ele, o PBM – e as políticas que o antecederam na última década – foram a expressão da retomada do Estado como indutor do desenvolvimento e formulador e coordenador de políticas como a desoneração da folha e mudança da tributação no mercado interno.
Como foi o caso do Inovar-Auto, que concedeu redução de IPI (Imposto sobre Produtos Industrializados) a empresas automobilísticas que investiram em inovação em pesquisa e desenvolvimento no Brasil.
O problema do Plano, destaca o técnico do Dieese, é que a discussão sobre relações de trabalho, inserida nos conselhos por pressão dos trabalhadores, não avança e, principalmente, o plano carece de uma visão mais ampla.
“O PBM acabou privilegiando atividades econômicas em detrimento de outras, mostrando um caráter conjuntural. Acabou tentando apagar incêndio e não estruturando, por conta da ausência de contrapartidas como investimento na qualificação, contratação e aperfeiçoamento da produção”, pondera.
Da CUT Nacional