Ponto de Vista|Como escolher um ministério


Walfrido Mares Guia (PTB) e Marta Suplicy (PT), dois dos novos ministros do governo Lula

O presidente Lula não tem como construir um ministério homogêneo. O PT não dispõe de maioria absoluta no Congresso nem na opinião pública. Não lhe foi possível antes nem lhe será possível agora
 
Por Mauro Santayana

Há duas formas de construir um ministério. A primeira
delas é a homogeneidade partidária e ideológica. A segunda é a
heterogeneidade, com a convocação de homens de posições diferentes,
quando não divergentes. Um ministério homogêneo é mais ágil, mas não
significa que seja mais eficiente. O que ganha no tempo das decisões,
perde na criatividade dos projetos ou na imprudência, quando é ousado.
Nos sistemas parlamentaristas, nos quais a composição do gabinete
corresponde, quase geometricamente, aos partidos da coalizão
majoritária, as divergências são inevitáveis e fazem parte da rotina,
além de ganhar na moderação.

Por
mais inclinados que eles estejam, para a direita ou para a esquerda, os
desencontros forçam o equilíbrio, na busca do centro. Muitas vezes – é
o que ocorre hoje na Alemanha – os dois partidos majoritários se reúnem
em grandes coalizões. Quando isso se dá, o governo perde a velocidade,
mas assegura a estabilidade política e, com ela, o desempenho da
economia.

Nos sistemas mistos,
em que se acomodam os modelos presidencialistas e parlamentaristas
(como na França e em Portugal), nos quais o chefe de Estado conserva
alguns dos poderes do presidencialismo puro, podem surgir divergências
entre o presidente e o primeiro-ministro, os dois entes de soberania,
como se diz em Lisboa. A convivência entre as duas personalidades
cimeiras do Estado tem o nome de coabitação, sugerido pela situação em
que marido e mulher não se dão, mas continuam vivendo sob o mesmo teto,
a fim de cuidar da família.

Não
é fácil o entendimento, mas, exatamente por isso, cuidam, tanto o chefe
de governo quanto o chefe de Estado, de seguir religiosamente os
dispositivos constitucionais que lhes fixam os limites. E, se a
convivência se torna impossível, prevalece a chefia do Estado, com a
dissolução do Parlamento, a nomeação de um gabinete de intervalo e a
convocação de novas eleições.

O
presidente Lula não tem como construir um ministério homogêneo. O PT
não dispõe de maioria absoluta no Congresso nem na opinião pública. Não
lhe foi possível antes nem lhe será possível agora. Em tese, o
presidente poderia nomear o ministério apenas com especialistas ou com
personalidades conhecidas por sua idoneidade moral. Nada, na
Constituição, o obriga a buscar auxiliares nas bancadas do Congresso.
Mas, dentro da má tradição do presidencialismo brasileiro, cerceado
pelo vício de origem, os ministros são impostos pelas bancadas
legislativas, ao contrário dos Estados Unidos, onde deputados e
senadores estão proibidos de exercer cargos executivos.

Não
lhe coube inventar o sistema, que compromete a natureza moral e
política da República. Ele existe desde a queda da monarquia, porque o
novo regime não ousou romper de todo com o parlamentarismo do Império.
A República nasceu sistema presidencialista hemiplégico. A fim de
manter a estabilidade da administração – o que poucas vezes ocorreu -,
os presidentes negociam a divisão do poder com as oligarquias
nacionais, representadas no Congresso.

Lula
aprendeu, com a dura realidade do governo, que o presidente da
República é um executivo das forças políticas nacionais, e não seu
reitor. Seria muito melhor que ele negociasse com o Parlamento como
poder, e não com os partidos e suas bancadas. Haveria, nesse caso, a
coabitação natural entre poderes republicanos, e não a situação de
hoje, na qual o número de votos parlamentares é relacionado aos
orçamentos do