"Dumping social"

Tal o açodamento do governo FHC em tentar enfiar goela abaixo da sociedade uma das mais desastradas de suas intervenções na legislação trabalhista, que a questão da reforma da CLT virou um verdadeiro samba do crioulo doido! Vai criar novos empregos? Vai acabar com as férias? Com o descanso semanal remunerado? Com o 13º? Vai fortalecer os sindicatos ou enfraquecê-los?

A confusão é de tal magnitude que até mesmo o acordo que fizemos com a Volks, recentemente, acabou sendo usado para tentar mostrar que era preciso flexibilizar a legislação trabalhista. O argumento, em si mesmo, é um profundo paradoxo: o acordo de flexibilização de jornada e salário da Volks é a prova cabal de que não é preciso flexibilizar a CLT.

Tudo foi debatido no curto espaço de duas semanas. Bastante curto para que a sociedade não se apercebesse das negociatas realizadas em torno dos R$ 5,1 milhões liberados pelo Governo FHC para 128 emendas ao orçamento apresentadas por deputados, cujos compromissos não vão além do próprio bolso ou dos escritórios dos lobistas que cercam Brasília. Curto o suficiente para passar desapercebido a liberação de quase R$ 3 milhões para uma central aliada ao governo e financiada por empresários, um dia depois da aprovação do projeto na Câmara.

Para tratar deste assunto é preciso, antes de tudo, começar por reafirmar compromissos históricos da CUT. Também entendemos que a CLT é um documento legal que precisa ser reformulado. E a primeira destas reformas é no sentido de permitir uma profunda revolução na estrutura sindical. É preciso garantir a liberdade e a autonomia sindicais – bandeiras da fundação da CUT – em seus principais pilares: o fim da unicidade e do imposto sindical. É preciso também reestruturar a justiça do trabalho e acabar com seu poder normativo.

Mas, concordar com a necessidade de reformar a legislação trabalhista para acabar com seus muitos absurdos, jamais significou concordar com a retirada ou flexibilização de direitos lá consagrados, como quer o governo. São direitos conquistados pelos trabalhadores de todo o mundo ao longo do século XX, e que cabe a nossa geração ampliá-los, senão, ao menos defendê-los.

Ao fazer a proposta de prevalecer o negociado sobre o legislado, já aprovada pela Câmara, o governo FHC, que se diz social-democrata, e sua base parlamentar estão criando um precedente legal cujas conseqüências serão profundas para a sociedade brasileira. Ao contrário da receita do estado da defesa do bem estar social, ele quer acabar com as defesas legais da sociedade e quer abandonar o trabalhador à sorte imposta pelas regras do mercado.

Se for implementada, ela vai erguer, em nível nacional, uma nova onda de exclusão social. Uma onda ainda mais grave que a da guerra fiscal, responsável, durante a década de 90, pelo desmonte de segmentos inteiros da economia nacional e pela explosão dos índices de desemprego. E, desta vez, não se tratará apenas de oferecer vantagens fiscais, galpões e outros incentivos à concorrência desleal entre as várias regiões do País.

Vamos instituir entre os trabalhadores a mais selvagem concorrência para saber quem consegue trabalhar com os menores salários e nas piores condições de trabalho. Aos vencedores, a senzala! Será que era este tipo de emprego que os defensores da reforma da CLT se referiam? Se era, eles tinham razão. Na verdade estamos falando de um verdadeiro “dumping social” abrigado pela lei.

Querer argumentar que é preciso flexibilizar a CLT para permitir aos trabalhadores novas conquistas trabalhistas chega à beira da provocação. Nem a CLT nem a Constituição impedem qualquer conquista de direitos. Só mesmo dirigentes sindicais oportunistas podem sustentar uma mentira deste tamanho. Só mesmo um governo que não tem nenhum compromisso com o social pode patrocinar esta política.

Mas há males que vem para bem. São tão profundas as ofensas que esta lei