Receitas devem crescer 11% no ano que vem, diz Paulo Bernardo
O ministro do Planejamento disse que os juros são os mais baixos da história e, até o final do ano, a expectativa do governo é que as taxas de juros reais (descontada a inflação) fiquem entre 2,5% e 3%
O governo não vai lançar programas novos em 2010, último ano do governo Lula, embora se estime para o próximo ano crescimento de receita de 11%.
Em entrevista exclusiva à Agência Brasil e à TV Brasil, o ministro do Planejamento, Orçamento e Gestão, Paulo Bernardo, disse que não é mais hora de fazer isso. Para ele, não há risco com o câmbio porque logo o real vai se depreciar, mantendo o equilíbrio cambial, nem do fantasma da inflação.
Ele considerou positiva a decisão do Senado de permitir o aumento de gastos de pessoal nos próximos dez anos até 2,5% acima da inflação, a cada dez anos, porque estabeleceu não um teto de salário, mas um teto para o crescimento da despesa.
Bernardo disse que Banco Central tem feito seu papel de “bater de chicote na inflação para que ela não cresça”. E o crescimento interno, após os estímulos do governo para aquecer a economia, e uma possível elevação da inflação também não são motivo de preocupação, porque o governo tem o controle da situação.
Segundo o ministro, os juros são os mais baixos da história e, até o final do ano, a expectativa do governo é que as taxas de juros reais (descontada a inflação) fiquem entre 2,5% e 3%. Ele admitiu, porém, que o governo tem problemas para que as taxas fiquem abaixo desse patamar por causa da poupança, por exemplo, que garante rendimentos de 6% ao ano para os investidores.
Bernardo criticou o Tribunal de Contas da União (TCU), afirmando que o órgão, em muitas ocasiões acaba extrapolando suas funções e impedindo o governo de governar. “Orgão de controle não é polícia, orgão de controle não é o governo eleito. O órgão de controle tem que controlar a boa qualidade do gasto. Não tem que dizer para o governo fazer isso ou aquilo.”
Quanto às parcerias público-privadas (PPPs), o ministro reconheceu que o projeto inicial não funcionou e que a saída encontrada foram as concessões públicas.. E os empresários, disse o ministro, “que estavam reclamando de barriga cheia e não estavam sendo francos conosco”, acabaram aceitando as concessões.
A seguir, a íntegra da entrevista do ministro:
Agência Brasil: No início do governo, a ordem era não gastar, fazer superavit primário. Depois, a atitude, a ideia adotada foi de que o governo deveria gastar mais. Veio a crise do ano passado e o governo, em vez de conter gastos, optou justamente por gastar mais ainda. Com a situação internacional melhorando, qual será a atitude para o próximo ano?
Paulo Bernardo: Nossa visão desse assunto é que devemos gastar o que tivermos. Há também uma força como componente na macroeconomia, que é a questão da inflação. Quando o governo começou, tínhamos uma inflação de 12,3%, ocorrida em 2002. Se fossem considerados os 12 meses até março de 2003, ou seja, o início do governo, [a inflação] estava em 17%. Nesse ritmo, teríamos uma inflação de 40 % em 2003. Então, o governo teve que adotar medidas muito duras em 2003. Uma coisa fundamental era bater na inflação. Depois dos dois primeiros anos, conseguimos manter a inflação dentro da meta. Em 2007, a inflação chegou a 3,14%, índice considerado muito baixo para o padrão brasileiro dos últimos 50 anos. Além disso, precisávamos ter uma avaliação dos programas que estavam sendo tocados e havia uma intenção manifesta do presidente [Luiz Inácio Lula da Silva] de reorganizar esses programas. Refizemos praticamente todos os programas da área social. E tivemos que preparar todo material para que a máquina voltasse a investir.
ABr: E quando o governo pôde começar a investir?
Bernardo: Depois desse período de grandes ajustes e com o governo considerando que estava com a casa em ordem. Tivemos grande crescimento em 2004 e nos anos seguintes, nos quais a receita cresceu bastante. Isso permitiu que fizéssemos uma rearrumação dos nossos programas e, principalmente, que retomássemos o programa de investimentos de forma ambiciosa. Quando o presidente lançou o PAC [Programa de Aceleração do Crescimento], as pessoas se surpreenderam porque era bastante ambicioso.
ABr: Com a crise, a atitude foi gastar mais. E, daqui para a frente, qual é a ordem?
Bernardo: A crise colocou um dilema para o governo. Quando veio a crise, ficou claro que a nossa receita ia ser menor. Sabíamos que íamos perder receita. A grande chave dessa questão foi que o presidente Lula chamou a equipe econômica, chamou a ministra Dilma Rousseff [chefe da Casa Civil], chamou o Meirelles [Henrique Meirelles, presidente do Banco Central], em momentos diferentes, e falou: ´se quisermos compensar o problema de perda de receita arrochando e tentando arrecadar mais, vamos piorar´. Lula achava que teríamos que fazer o contrário: ´vamos afrouxar um pouco a preocupação arrecadatória e dar um fôlego para a economia´. Deliberadamente, o governo diminuiu impostos e instituiu novos programas, que acabaram significando gastos. Só no programa Minha Casa, Minha Vida, serão R$ 34 bilhões de despesas do Tesouro. Mas está comprovado hoje, e todas as pessoas têm isso como demonstrado: o governo agiu de forma corretíssima. Fizemos uma inflexão, evitamos que a economia entrasse em um colapso muito maior, tivemos dois trimestres muito ruins, mas conseguimos nos salvar. Se não tivéssemos feito isso, iríamos gastar mais de outro jeito. Os Estados Unidos, por exemplo, gastaram bilhões para socorrer empresas, bancos. A General Motors praticamente foi estatizada. Grandes bancos receberam polpudas ajudas do governo.
ABr: Que efeitos sobre as contas do governo a crise provocou?
Bernardo: Para se ter uma ideia: só com o aumento, relativamente pequeno, do desemprego até março já teve um aumento enorme de despesas com seguro-desemprego. Gastamos R$ 10 bilhões com o seguro-desemprego no primeiro semestre deste ano. Se deixássemos a economia se esborrachar, o governo acabaria tendo mais gastos e com mais custo social, mais tempo para resolver o problema. Acho que o governo atuou de forma correta.
ABr: E em relação aos salários?
Bernardo: No caso dos aumentos salariais, foi diferente. Negociamos os acordos salariais no momento pré-crise. Fizemos acordos para cumprir durante um período de três anos, até porque não tínhamos como dar a valorização que considerávamos razoável para o servidor público sem dividir ao longo dos anos. Dividimos para 2008, 2009 e 2010. Isso foi outro problema. Poderíamos até avisar que não tinha dinheiro, que teríamos que suspender, transferir, mas a decisão do presidente foi cumprir o acordo. Evidentemente, se fosse hoje, não teríamos feito acordo naqueles patamares. Por outro lado, temos hoje servidores mais motivados, temos condições de cobrar mais. É verdade que já tem gente reivindicando, coisa que não temos como atender agora, mas acho que melhorou bem a situação dos servidores durante o governo Lula.
ABr: O governo vai conseguir cumprir o PAC até o final de 2010?
Bernardo: O PAC está andando muito mais rápido agora. Já acelerou bastante, e a tendência é acelerar mais ainda. É possível que algumas obras de maior envergadura fiquem para ser terminadas em 2011, ou 2012. Mas, no ano que vem, vamos ter um período em que não vai ter agenda suficiente para inaugurarmos obras do PAC.
ABr: O que o senhor achou das críticas feitas pelo ministro da Controladoria-Geral da União (CGU), Jorge Hage, sobre a proposta de Lei Orgânica da Administração Pública que está sendo preparada pelo Planejamento?
Bernardo: Não vi tudo que ele falou. Vi algumas coisas no jornal e conversei com o presidente. Ele disse que vai retomar essa discussão. Temos um projeto que reorganiza a administração pública. O projeto foi pedido pelo Ministério do Planejamento a sete juristas, que fizeram isso em um ano e meio, sem cobrar nada. Na nossa opinião, o projeto ficou muito bom. Estamos agora em uma fase de consulta pública para debate do projeto. Falaram que era um projeto para diminuir o poder do TCU, mas isso não tem nada a ver. O projeto tem apenas três ou quatro artigos que tratam do TCU, em um universo de 100 artigos.
ABr: Por que esse conflito com o TCU?
Bernardo: Acho que temos de definir a situação da seguinte forma: qual é o interesse público maior e de que forma a gente organiza a administração? Não podemos ficar sujeitos a fazer esse ou aquele movimento em função do interesse de alguma corporação, de algum sindicato, de alguém que ache pontualmente que seus interesse serão prejudicados. Isso seria um desastre, porque não podemos ser a ´república das corporações´. O presidente Lula vai saber tratar isso de forma correta e ver o que é bom para o país. Como é que podemos tratar isso para melhorar a organização da administração pública? Esse é o foco que temos e nós queremos discutir sob esse aspecto.
ABr: A grande crítica ao projeto, feita pelo ministro Hage e também pelo TCU, é que a proposta coloca como exceção os controles feitos de forma prévia ou concomitante. A proposta não abre, nesse artigo, espaço para desvio de recursos públicos?
Bernardo: Temos que separar as funções. Orgão de controle não é polícia, orgão de controle não é o governo eleito. O órgão de controle tem que controlar a boa qualidade do gasto. Não tem que dizer para o governo fazer isso ou aquilo. Temos um presidente que foi eleito com 52 milhões de votos e tem que ficar discutindo se vai fazer isso ou aquilo, desse ou daquele jeito. Acho que, aí, há uma inversão de valores odiosa. Tem muita gente que se alinha a essa visão do TCU. A oposição, por exemplo, acha que o TCU tem que controlar tudo. Pensa assim: ´vamos deixar o TCU tomar conta do país, porque aí o governo está ferrado´. Mas isso não serve aos interesses do país, não ajuda em nada. O Brasil é uma democracia, tem alternância de poder. Se a oposição melhorar muito, pode também passar a ser poder, pode ganhar a eleição. Mas acho que tem que melhorar muito porque o discurso [da oposição] está ruim, ou até está sem discurso, sem projeto. Não se pode defender um estado de coisas no qual o governo fique completamente engessado por um grupo, por um segmento. Ou então que se diga que não vamos mais fazer investimentos, que o país não precisa de investimentos, que os aeroportos, do jeito que estão, estão bons, que as estradas estão boas, que não precisa fazer ferrovia. Isso é um absurdo.
ABr: Mas afrouxar o controle não pode contribuir para o aumento da corrupção utilizando obras públicas?
Bernardo: Ninguém quer eliminar o controle, ninguém quer que não haja fiscalização. Acho deplorável pensar que o TCU tem que vir aqui antes de eu fazer qualquer coisa e dizer se aquilo pode ser feito ou não. E os ministros do TCU concordam com isso. Há uma discussão pública sobre a necessidade de prestigiar o TCU, e eu concordo com isso, mas vamos ser francos, o TCU é um órgão auxiliar do Congresso Nacional, está na Constituição. Não queremos, de forma nenhuma, impedir que o TCU funcione.
ABr: E sobre as críticas vindas da CGU?
Bernardo: A CGU é um órgão do governo. O ministro da CGU é um auxiliar do presidente Lula. Aí é que não pode mesmo dizer para o presidente o que pode ou o que não pode fazer. É uma coisa para ser resolvida internamente no governo. Não há como achar um ponto de equilíbrio para permitir que as coisas andem? O ponto de equilíbrio é o que estamos propondo. Esse projeto não foi feito pelo Ministério do Planejamento, não foi feito pelo governo. Foi feito por pessoas que têm estofo para fazer. São estudiosos que se dedicaram. A administração pública precisa de uma reorganização.
ABr: Não há como achar um ponto de equilíbrio para permitir que as coisas andem?
Bernardo: O ponto de equilíbrio é o que estamos propondo. Esse projeto não foi feito pelo Ministério do Planejamento, não foi feito pelo governo. Foi feito por pessoas que têm estofo para fazer. São estudiosos que se dedicaram. A administração pública precisa de uma reorganização.
ABr: Da forma como está a proposta, está garantido que tenhamos obras sem corrupção?
Bernardo: Acredito que sim. A proposta dá conta de garantir e é possível fazer obra sem corrupção. Não aceitamos também a ideia de que só tem bandido e ladrão na administração pública. Temos que discutir as coisas de forma transparente. A proposta vai para o Congresso e, chegando lá, vamos discutir abertamente. Por que estão com tanto medo assim? Qual é o problema?
ABr: Como está a proposta de cobrar eficiência dos servidores públicos?
Bernardo: Nós já temos várias coisas que estão sendo implementadas. Todos os acordos salariais incluem gratificação por desempenho com a devida avaliação, embora nós ainda consideremos que isso não é suficiente. Além disso, estamos testando, em alguns órgãos, uma forma de avaliação mais aprofundada, inclusive ligada à remuneração salarial, com bônus por desempenho. O órgão que atingir seus objetivos, suas metas, tem um pouco mais de folga no Orçamento do ano seguinte. Mas é importante destacar que a máquina pública sempre teve ilhas de excelência, como em qualquer lugar. Nós tivemos exemplos na diplomacia, na Receita, em vários órgãos, que sempre foram muito bem equipados com bons salários e funcionamento muito bom. No entanto, em outros lugares, como as agências do INSS [Instituto Nacional do Seguro Social], o salário era pequeno e a qualidade do serviço um pouco menor. No início do governo Lula, as pessoas iam às filas à noite para serem atendidas pela manhã ou tinham de comprar senhas nas mãos de pessoas que se especializavam nessa prática. Hoje, nas agências do INSS, se agenda o atendimento. Quando [o segurado] vai lá, no máximo em 30 minutos pode ser aposentado. Mais ainda. Eles começaram a mandar, agora, para o “aposentando”, 30 dias antes, em casa, um comunicado dizendo o dia da aposentadoria. É só agendar para receber o benefício. Então, esse gasto foi bem feito em termos de atendimento para o cidadão. Foram mudanças importantes porque era um vergonha, pois todo ano tinha uma greve na Previdência que nunca era de menos de um mês. O pessoal estava desestimulado, o salário era ruim, atendia sem aparelhamento. Hoje, as agências são todas informatizadas. Tanto que se você olhar, salvo uma exceção deste ano, faz quatro ou cinco anos que nós não temos greve do INSS. Este ano, teve uma greve que envolveu 2 mil servidores do total de 38 mil. O que mede o desempenho do INSS é a fila. Se tiver um monte de gente lá [na fila], você não pode dizer que está bom. Hoje, você é atendido como gente. Dez anos atrás não era assim. Chegava lá e passava raiva. O servidor também sofria porque o cidadão jogava o problema para ele, brigava e queria bater nele. Nós conseguimos mudar isso. Agora, dizer que isso pode ser aferido. Acho que não.
ABr: Mas a burocracia no serviço público não continua sendo um problema no atendimento do cidadão?
Bernardo: Nós temos um cultura burocrática. Se você olhar a legislação, está cada vez pior por mais que procuremos fazer coisas para melhorar. O tipo de exigência que é colocada na legislação torna o processo cada vez mais burocratizante. Muitas vezes, o servidor fica inseguro pois pensa: se eu assinar isso aqui vou ser responsabilizado pessoalmente. Veja o caso do Ibama [Instituto Brasileiro do Meio Ambiente e dos Recursos Naturais Renováveis], em que o presidente do instituto e mais sete servidores estão sendo processados porque deram uma licença a um empreendimento. Quer dizer, eles cumpriram a função deles, pois é a mesma do órgão, que é dar uma licença. Ou seja, se tiver alguma dificuldade nisso é do Estado brasileiro. Agora, você processar o servidor, na verdade, é uma forma de garantir que não seja dada a licença. Acho até uma coisa ditatorial esse processo contra os servidores do Ibama, um abuso de autoridade, uma visão policialesca do Ministério Público, processar um servidor que cumpriu sua missão.
ABr: No início do governo Lula, o objetivo era fazer um trabalho conjunto com a iniciativa privada por meio das parcerias público-privadas, as PPPs. O governo desistiu disso?
Bernardo: Eu acho que não funcionou. Alguns governos estaduais aproveitaram a lei e fizeram pequenas experiências. Nós estamos, agora, lançando um edital para fazer uma PPP com irrigação.
ABr: O que deu errado?
Bernardo: Acho que isso é uma coisa para ser consolidada. Primeiro, no Brasil, o que se falava antes era que o empresariado não tinha confiança de fazer uma parceria e depois ter retorno, ser remunerado. Então, havia um problema de confiança, como insegurança jurídica. O Brasil já quebrou regras, já mudou contrato, mudamos a moeda sete ou oito vezes. Não sei se vou ser duro, mas além dessa desconfiança, agora existe uma certa ganância do setor empresarial. Fizemos uma PPP para a Ferrovia Norte-Sul e chegamos à conclusão de que era mais fácil fazer uma concessão. Fizemos com a BR-116, com a BR-324 e, nesse caso, eu conversei pessoalmente com um empresário. Ele me disse: ´não pode ser assim, dessa forma. Do jeito que está, ninguém vai querer entrar. Nós não vamos ganhar o suficiente´. Eles [os empresários] queriam taxas altíssimas. Largamos esse negócio e passamos à concessão. Ele foram lá, disputaram e fizeram sem receber nada. Estavam vindo aqui de barriga cheia nos enrolar. Eles não estavam sendo francos conosco. Mas acho que a PPP tem condições de ser feita. A tendência é isso acabar dando certo. E, depois, tem o seguinte: a tendência é nós acabarmos viabilizando à medida que as coisas vão andando. Quando fizemos é porque, no início, nós não tínhamos condições de fazer determinados investimentos. Hoje, nós temos opções. Se não der, fazemos por concessão. Se não, fazemos com dinheiro do Orçamento. O Brasil conquistou, hoje, um condição diferente para fazer investimentos.
ABr: Com isso, o senhor indica, então, que o governo conseguiu criar esse clima de confiança que permitiria o país desenvolver, no futuro, esse tipo de parceria?
Bernardo: Não sei se é uma boa medida. Estamos fazendo investimentos e de forma crescente. Acabou aquele negócio do empresário ficar com conta atrasada e, depois, o cara ficar arranjando um cara com influência para receber. Se você olhar atualmente, no PAC, o tempo máximo entre a expedição de uma fatura e o pagamento é 15 dias, com um tempo médio de sete dias. Então, se os empresários não tiverem confiança nisso, vão ter com o quê? Eles querem fazer o serviço e receber. Isso está correto.
ABr: Ministro, 2010 está chegando. O governo prevê a volta de arrecadações melhores com o crescimento da economia? Os programas para o cidadão de baixa renda vão ser ampliados?
Bernardo: Nós não mudamos nada. Vai continuar do jeito que está. Nós não cortamos nada. Todos os nossos programas sociais foram mantidos. A partir do Bolsa Família, os programas de aquisição de alimentos, de investimento na educação, todos foram mantidos. Nós não mudamos nada, não teve corte de nada. Também não vamos lançar programas novos. Porque o último ano [de mandato] não é hora de fazer isso. Os programas, como o Bolsa Família, passaram por uma grande reavaliação, neste ano, inclusive com reajuste. Está tudo garantido e não tem nenhuma dificuldade quanto a isso. Agora, lançar programas é assunto para o próximo governo. Não tem sentido nós chegarmos ao último ano de governo e ficarmos lançando programas. Nós temos várias ideias boas que poderão ser usadas pelo próximo governo, que será eleito em 2010, e que poderão ser usadas pelo governo que entrar. Uma coisa é a ampliação do PAC-2, que está sendo preparada pelo presidente Lula. Outra coisa é a meta de desenvolvimento para a educação, com investimentos previstos em 2011, o trem de alta velocidade e os investimentos para preparar a Copa de 2014 e as Olimpíadas de 2016. Não dá para esperar, né?
ABr: E a questão do câmbio. O senhor está vendo algum tipo de risco?
Bernardo: Não estou vendo risco nenhum. Tem um problema que os exportadores reclamam pelo fato do real estar muito valorizado em relação ao dólar. Mas essa semana tivemos um reunião com o pessoal do Banco Mundial e os economistas da instituição avaliaram que o câmbio vai reequilibrar no ano que vem. E que o real vai se depreciar em relação ao dólar. Não sei em que medida. Agora, não temos risco cambial porque temos mais de US$ 230 bilhões em reservas. Para o Brasil enfrentar alguma turbulência, nós temos condições de recorrer às nossas reservas. E é bom lembrar que nós atravessamos toda essa crise com US$ 205 bilhões. Acho que o Brasil tem uma coisa interessante: um mercado interno pujante e uma classe média que ascendeu porque antes não tinha poder aquisitivo e, hoje, está comprando celular, geladeira, carro. Essa classe quer a casa própria, pois essas pessoas praticamente não tinham acesso aos programas habitacionais. Pessoas com salários de até R$ 1.200 e que não conseguiam arrumar moradia com prestações compatíveis e isso já pode ser feito por meio do Programa Minha Casa, Minha Vida.
ABr: Uma maior oferta de crédito não pode provocar inflação?
Bernardo: Eu não acredito nisso de forma nenhuma.
ABr: Então, é exagero essa preocupação do Banco Central com inflação em consequência do crescimento interno, do consumo, quando mantém a taxa básica em 8,75%?
Bernardo: Eu não sei porque as pessoas se surpreendem. O BC inteirinho é conservador. A função dele é essa: bater de chicote na inflação para que ela não cresça. Agora, com toda a sinceridade, não temos como ver grandes problemas de pressão inflacionária aqui. Pelo menos, em 2010 e num pedação de 2011. Este ano vai ser menos que a meta: 4,2%, 4,3%. No ano que vem, o próprio mercado está falando em 4,3%, 4,4%. Acho que também não pode ficar com esse fantasma. Mas tem que vigiar. A inflação é um problema, como uma pessoa que foi alcóolatra e não pode beber. O Brasil tem um problema com a inflação. Tem que segurar mesmo. Não pode brincar com isso. Se brincar, ela vem e come a nossa perna. Estamos bem controlados nesse aspecto.
ABr: Mas os juros não estão altos ainda?
Bernardo: A taxa de juros de 8,75% é a menor que já teve. Se descontar a inflação, significa uma taxa real de 4,5% ao ano. É bom lembrar que nós temos financiamentos de algumas linhas de investimento de 4,5% fixo. Estamos no melhor patamar histórico. Acho que se nós mantivermos a inflação controlada e as nossas contas equilibradas e continuarmos crescendo, a dívida vai cair mais ainda, em proporção ao Produto Interno Bruto [PIB]. Com todas essas reservas, a tendência é que nós, no próximo governo, vamos ter condição de trabalhar para ter juros reais de 2,5%, 3% [descontada a inflação]. Para baixar mais, tem problema porque vocês sabem que poupança garante juros de 6% ao ano. A redução tem suas limitações. O presidente Lula, quando sair do governo, vai deixar juros reais de 2,5%, 3%. Isso nunca aconteceu.
ABr: Como ficam as receitas, com o crescimento da economia, a partir de agora?
Bernardo: A nossa receita vai crescer 11% em 2010, mas isso não é uma fartura. Por exemplo, para estados e municípios melhora. Mas, para o governo federal, é um momento de equilíbrio porque voltamos a fazer mais superavit primário. Todo mundo sabe que, neste ano, abrimos mão de parte do superavit [por causa da crise] para folgar para o crescimento econômico.
ABr: O que o senhor diria sobre a proposta aprovada ontem (16), no Senado, que limita as despesas com pessoal?
Bernardo: O que foi aprovado no Senado diz que a despesa com pessoal nos três poderes nos próximos dez anos, só pode subir 2,5% acima da inflação, a cada ano. Essa é uma medida, na minha opinião, muito positiva porque estabelece não um teto de salário ou teto de reajuste, mas, sim, um teto para o crescimento de despesa. Significa que se você contratar mais gente vai poder dar menos reajuste. Tanto o governo como o Judiciário e o Legislativo vão ter que fazer um planejamento maior. Isso estabelece um previsibilidade na questão do gastos, um ponto em que nós somos mais criticados. A medida ainda precisa ser aprovada pela Câmara [Câmara dos Deputados]. É evidente que se você pagar a nata dos servidores e aumentar seu salário desmedidamente vai sobrar pouco para os servidores de menor salário. Na verdade, vai ter que ter uma briga, até do sindicato, que vai querer equilibrar essa disputa.
Da Agência Brasil