Saúde – A fome

Bartô é um operador de prensas, experiente, muito bom naquilo que faz e muito rápido. Trabalha sempre com vontade. Orgulha-se do seu desempenho. Sempre dá conta do recado.
Hoje, porém, algo novo vai acontecer. Mal esquenta na sua tarefa diária de fazer milhares de garfos, facas e colheres, e já vem o supervisor mandando parar. Em seguida, começa a falar:
– É, meu amigo, você é muito bom, trabalha bem, mas agora é diferente. Precisamos aumentar a produção e a situação exige que cada um dê um pouco mais de si. E continua:
– Você vai ter de trabalhar um pouco mais rápido, parar menos, começar mais cedo, ir até mais tarde e também vir nos finais de semana. Sabe como é, o
patrão quer mais empenho.
-Conte comigo, diz Bartô, ligando a máquina.
Mas, antes de voltar a trabalhar, olha para a prensa e diz:
– É, amiga, você agora vai arrepiar na minha mão. Vamos ver quem é melhor, eu ou você.
Bartô se espanta ao falar com a prensa, que agora se parece mais com uma pessoa.
Seu mecanismo subindo e descendo, parece uma enorme boca, por onde ele enfia facas, garfos e colheres, que ela mastiga e cospe com uma fome insaciável.
Com um susto, ouve a prensa responder:
– Você não me vence, sou melhor, mais forte e mais rápida. Além disso, não me canso, nem me distraio como você, pobre humano.
Prensas não falam, pensou ele. Só pessoas humanas falam e as prensas são pessoas mecânicas, sem o dom da conversa.
Mesmo assim, retruca:
– Vou te mostrar que sou melhor que você.
E começa a trabalhar cada vez mais veloz. A mão direita posiciona a faca e o pé direito já pressiona o pedal, sente o impacto e, enquanto a mão esquerda
retira, a direita já coloca outra faca e o pé age novamente. Tudo automático. E a prensa dizendo:
– Não aguentas muito mais. Em pouco tempo você se cansa e aí…
– Prensa maldita, responde ele, vou acabar com teu papo. Vou acelerar ainda mais e te deixar na poeira.
Passam uns poucos minutos e a mão não percebe que acabaram as facas da caixa. Mesmo vazia, habituada ao movimento, a mão entra rápida pela boca da maquina, que se fecha ao comando preciso do pé.
A dor nem chega a doer. Só o vermelho das carnes tinge aquela boca faminta, agora parada e satisfeita.
Acudido pelos colegas, Bartolomeu, com o que sobrou da mão embrulhado em um pano, dá uma última olhada para a máquina.
Ela continua com sua boca aberta, com um sorriso, que só se vê nos vencedores.

Departamento de Saúde do Trabalhador e Meio Ambiente