Serra ignora sindicatos e manobra para dividir grevistas da polícia civil

Governador tucano oferece ´vantangem´ a policiais do interior do Estado

Quatro dias depois de mobilizar a tropa de choque da PM para bloquear uma passeata de policiais civis em greve, o governo Serra esboçou disposição de negociar.

 

A negociação é atípica, contudo. Foi aberta em pleno final de semana. Tem caráter informal. Envolveu apenas os policiais do interior do Estado.

 

Para complicar, os negociadores do governo, cujos nomes foram mantidos à sombra, passaram por cima dos sindicatos que representam os policiais.

 

O comando da polícia civil encomendou às seccionais do interior uma consulta aos grevistas. O governo se dispõe a conceder-lhes uma vantagem.

 

A coisa consiste no seguinte: além do reajuste de 6,5% que Serra admite conceder, seria eliminada uma das três faixas de uma gratificação chamada ALE (Auxílio de Local de Exercício).

 

Trata-se de um adicional calculado de acordo com o tamanho da cidade em que trabalha o policial. Hoje, há três faixas.

 

A menor é paga aos policiais de cidades com menos de 200 mil habitantes. A intermediária, vale para localidades com até 500 mil habitantes.

 

A mais alta vai ao contracheque dos policiais de municípios com mais de 500 mil moradores. A diferença entre uma faixa e outra é mixuruca: cerca de R$ 250.

 

O governo propõe a extinção da faixa mais baixa. Seriam mantidas apenas a intermediária e a alta. Em troca, pede a suspensão da greve.

 

Levado aos policiais do interior neste domingo (19), o aceno do governo não gerou grande entusiasmo. De resto, malogrou a tática de alijar os sindicatos da negociação.

 

Em telefonemas disparados durante o dia, a turma do interior manteve os mandachuvas da greve, na capital, informados acerca da movimentação do governo.

 

Ouça-se, por exemplo, João Batista Rebouças, presidente do Sipesp (Sindicato dos Investigadores de Polícia do Estado de São Paulo):

 

“Pelo que soube das pessoas que me ligaram do interior, a paralisação está mais forte do que nunca…”

 

“…Essa proposta não é nova nem resolve coisa nenhuma. Já tinha sido feita em agosto. Nossa reivindicação é clara: reajuste de 15% em 2009, 12% em 2009 e 12% em 2010…”

 

“…Não adianta o governo ficar jogando dessa maneira. O governo precisa apresentar uma proposta . Tem que ter proposta concreta. Não adianta ficar jogando…”

 

“…Se a intenção do governo fosse séria, chamariam as entidades e diriam: ‘nossa proposta é essa. Ponto. E a gente faria uma contraproposta…”

 

“…É assim que funciona uma negociação. Não tem segredo. O que há é falta de disposição do governador Serra de sentar à mesa com a polícia”.

 

Na manhã desta segunda (20), as 16 entidades que representam os policiais se reúnem para decidir os rumos da greve. São 14 sindicatos e duas associações.

 

A tendência é de manter a paralisação. Mais: tenta-se levar o movimento para além das fronteiras de São Paulo.

 

No final da tarde, presidentes de sindicatos de dez Estados vão discutir os detalhes de uma curzada de braços nacional em solidariedade à polícia de São Paulo.

 

Planeja-se uma greve de um dia das polícias civis de todos os Estados e do Distrito Federal. Seria no dia 29 de outubro.

 

Nesse mesmo dia, os grevistas de São Paulo fariam uma nova manifestação. Dessa vez na Assembléia Legislativa do Estado, para evitar novo confronto com a PM.

 

Sérgio Marcos Roque, presidente da Adpesp (Associação dos Delegados de Polícia do Estado de SP) é uma das vozes mais ponderadas do comando de greve.

Diz coisas assim: “O ânimo do nosso pessoal está bem acirrrado. Não é hora de colocarmos mais lenha na fogueira”.

 

Ele se esforça para enxergar a movimentação do governo com benevolência: “Não deixa de ser uma evolução. Pelo menos já se está negociando”.

 

Mas a boa vontade esbarra no tamanho da oferta. Sérgio Roque acha que a simples mexida nas faixas do adicional de localidade é “melhoria pequena”.

 

Daí a assertiva de João Batista Rebouças, o presidente do sindicato dos investigadores, de que “a paralisação está mais forte do que nunca.”

 

Rebouças estava na linha de frente da passeata de quinta-feira, aquela que resultou na guerra campal com a PM, nas proximidades do Palácio dos Bandeirantes.

 

Irritou-se com a acusação de Serra de que a CUT, a Força Sindical e o PT estariam insuflando os policiais. “A greve é da polícia”, diz.

 

Reconhece que os grevistas serviram-se de um caminhão de som da Força Sindical. Mas dá de ombros: “Somos uma entidade pobre. Não temos carro de som…”

 

“…Quem quiser nos oferecer caminhão, microfone, coisas que custam caro, será muito bem-vindo. Se dou uma festa na minha casa e alguém chega com a cerveja, não vou mandar embora.”

 

João Rebouças ecoa Lula: “Ontem [sábado], até o presidente da República disse que o governador precisa parar com esse negócio de acusar terceiros e assumir as suas responsabilidades. Tem que negociar, democraticamente”.

 

Do Blog do Josias de Souza (Portal do UOL)