Sinais de uma nova TV

Uma TV pública independente do mercado e dos governos de plantão. Capaz de gerar informação de qualidade, cultura, prazer e alcançar audiência sem ser movida a baixaria. A missão parece impossível, mas começa a ser levada adiante

Por Christiane Peres


Influência
A TV é uma concessão pública e, segundo a Constituição, deve ser instrumento para formar cidadãos e não apenas consumidores

O que passa na televisão facilmente vira assunto. Dependente do modelo da audiência a qualquer preço, a TV submete seu conteúdo à lógica do espetáculo e do mercado. A tela colorida, presente em 92% dos lares do país, orienta padrões de consumo, debates políticos e para muita gente é a única forma de acesso a informação e cultura. Quem pode paga em média 80 reais mês por um serviço por assinatura, com dezenas de canais públicos e privados, nacionais e internacionais, e monta sua janela para o mundo audiovisual. Quem não pode serve-se do conteúdo das emissoras nacionais de TV aberta, a maioria privada.

A Constituição prevê que os sistemas públicos, estatais e privados na comunicação se complementem, mas o que ocorre hoje no Brasil é um domínio explícito. O setor privado comercial detém 81% dos canais, alcança mais de 90% da audiência e abocanha 95% das receitas geradas pela atividade. E não aceita rediscutir as regras para utilização das concessões públicas. Impõe-se como bloco de poder, se auto-regulamenta e rejeita mudanças, sob a alegação de que seriam ameaças à “liberdade de expressão”.

Paralelo a isso, existe no Brasil um conjunto de TVs que, em tese, deveria trabalhar mais próximo do interesse dos cidadãos, e não do mercado. São as TVs públicas, estatais, universitárias, legislativas, comunitárias. Até agora, as emissoras públicas tiveram em sua maioria histórias ligadas a conteúdos cansativos, monótonos, de baixa qualidade, à ausência de regras públicas e a ingerências políticas dos governantes de plantão – que definem o orçamento e o comando de acordo com seus interesses.

Os modelos existentes hoje não conseguiram inovar na linguagem nem consolidar uma programação diferenciada da TV comercial. Têm baixa capacidade de formar cidadãos críticos. A situação reflete um descaso de anos. Diferentemente do que ocorreu em países como Inglaterra, Japão e França, aqui a TV pública só surgiu em 1968, quase duas décadas depois da comercial, sem originalidade e dependente de governos e entidades por eles influenciadas.

“Nosso sonho é que daqui a alguns anos a TV comercial passe a imitar a pública, como esta fez durante tanto tempo”, diz o presidente da Associação Brasileira de Produtoras Independentes de Televisão (ABPI-TV), Fernando Dias. Depois de ver o debate sobre mudanças na comunicação, como o da Agência Nacional do Cinema e Audiovisual (Ancinav), ser massacrado por interesses das grandes emissoras, integrantes do governo e da sociedade civil impulsionaram a rearticulação do setor público. A discussão sobre o papel social da televisão teve seu auge no 1º Fórum Nacional de TVs Públicas, realizado em Brasília no mês passado.

“As pessoas não deveriam ter de pagar para ter acesso a programas de qualidade. Queremos competir na qualidade e no profissionalismo. Precisamos ter uma TV que as pessoas tenham prazer de ver. Nós vamos fazer uma TV pública”, disse o presidente Lula, no encerramento do Fórum.

Incentivar um novo padrão público de comunicação é, para o governo e estudiosos, apostar no novo, na ousadia da linguagem e na interatividade. O ministro da Secretaria de Comunicação Social, Franklin Martins, defende o aumento da presença de produções independentes na programação. “Vocês podem imaginar o que são 30 horas de produção independente, o que isso significa em termos de explosão de criação de talento, de gente que não encontra espaço em outro lugar para aparecer?”, pontuou o ministro.

Para garantir que esse novo modelo discutido não esteja preso ao governo ou ao merc