Somente mudança cultural da sociedade vai agilizar avanços do ECA
Marco Antônio da Silva, conselheiro do Conanda (Conselho Nacional dos Direitos da Criança e do Adolescente) avalia os 20 anos do Estatuto da Criança e do Adolescente
Raquel Camargo
Para Markinhus, o ECA avançou em questões como a mortalidade infantil, mas, para melhorar, é preciso acabar com as desigualdades sociais
Ao fazer um balanço dos 20 anos da aplicação do Estatuto da Criança e do Adolescente (ECA), Marco Antônio da Silva, o Markinhus, disse que os avanços no setor serão mais rápidos a partir de uma mudança cultural da sociedade. Ele é coordenador geral do Projeto Meninos e Meninas de Rua de São Bernardo e conselheiro do Conanda – Conselho Nacional dos Direitos da Criança e do Adolescente.
Qual a avaliação do ECA depois de 20 anos de existência?
É uma lei importante, em que as crianças e adolescentes passaram a ser sujeitos de direito. Muito se avançou, mas ainda tem muito o que fazer. Para o ECA ser aplicado na sua totalidade é preciso um processo de mudança cultural da sociedade.
Porque é importante essa mudança cultural?
Sem essa mudança cultural, a sociedade vai continuar permitindo a criança na rua. Se tem um cachorro louco solto, a sociedade não permite. Mas tolera a criança de rua, tolera a violência como forma de educação e também a concentração do dinheiro nas mãos de poucos. Também existe a cultura do Estado autoritário, já que o escravismo não foi superado.
O que falta para melhorar?
A democracia participativa é um processo em construção e é necessário um esforço da sociedade para garantir esses espaços. Ainda não estamos capacitados para conhecer um orçamento ou formular políticas, ou os caminhos a serem tomados quando o Judiciário não cumpre a lei.
Como é possível avançar?
O fortalecimento dos conselhos é um dos caminhos para o ECA avançar. É preciso mexer na questão econômica para melhorar a distribuição de renda. É necessário encarar o preconceito e a discriminação racial. Além disso, o ECA precisa estar atrelado às políticas voltadas às mulheres e ao fortalecimento da família. Outro ponto é que ainda não temos uma sociedade organizada com a cultura da participação.
É preciso mexer com a subjetividade da sociedade. Hoje a polícia sobe todo dia nos morros do Rio e mata trabalhadores e crianças. Aqui em São Paulo a polícia faz a mesma coisa e a sociedade fica calada. O entendimento social é que o Estado pode matar para melhorar a segurança, desde que não seja meu filho, meu pai ou determinada classe social.
Como você enxerga o país hoje?
Hoje temos no Brasil uma parte Alemanha, com bons salários e boa qualificação educacional, e uma parte Haiti, aquela da população sem direitos. Os problemas começam na hora de levar o Haiti até a Alemanha. A elite, com ajuda da mídia, criticou que os Centros Educacionais Integrados (CEU) eram muito caros. Isso porque o dinheiro estava sendo investido na periferia.
Existiram outros avanços?
Tivemos avanços na redução da mortalidade infantil. Há 20 anos tínhamos 45 mortes por mil crianças nascidas e hoje são 28 mortes por mil nascidos. Ainda é alto, já que em Cuba é de 7 mortes por mil nascidos, mas esse percentual está caindo ano a ano.
Na educação temos entre 93% a 97% das crianças matriculadas na escola. Esse é o lado Alemanha. Falta uma educação de qualidade, que é a parte Haiti.
O menor está saindo da área policial para entrar na área social. A não ser no caso do menino infrator, uma criança abandonada é uma questão social. Antes ela era vista como um bandido em potencial.
A sociedade também está acordando e começando a perceber que ela sai perdendo com o trabalho infantil. Mas ainda dizem que é melhor a criança trabalhando do que roubando. Além disso, a sociedade está denunciando mais os abusos e a violência contra a criança e adolescente.
Quais as políticas que as esferas de governo podem desenvolver para melhorar?
Regionalmente, temos de definir um padrão de lidar com os usuários de drogas e com os meninos de rua. Existe a necessidade da adoção de um princípio regional de conduta com métodos estabelecidos, pois hoje eles são diferentes de cidade para cidade.
Também não da para ficar somente com políticas de governo. É preciso avançar para políticas de Estado, senão quando muda o governo essas políticas mudam ou desaparecem. A região do ABC também tem de conversar com São Paulo, pois não da para criar um muro isolando a parte pobre da parte rica da sociedade.
Confira abaixo a programação de comemoração dos 20 anos do ECA
13 de julho às 18h
Lançamento da Campanha do Fundo Municipal no Centro de Referência do Idoso, Av. Redenção, 271, Centro de São Bernardo
17 de julho às 9h30
Show de encerramento do Projeto Movimente na sede da Fundação Criança, na Rua Francisco Visentainer, 804, Assunção.
21 a 23 de julho
Seminário de Capacitação e Troca de Experiências para Profissionais que atuam no Sistema de Garantia de Direitos e na Rede Criança Prioridade 1. Na Fundação Criança
24 de julho às 9h
Ação lúdica de integração com crianças e adolescentes atendidos pela Fundação Criança, de escolas e outras entidades de São Bernardo. Na Fundação Criança.
7 de agosto
Conferência Lúdica Regional do Consórcio Intermunicipal do Grande ABC.