Trabalhadores terão vale de R$ 50 por mês para consumir Cultura
Em entrevista para o Bom Dia Ministro, Juca Ferreira (Cultura), explica os objetivos do PAC das Cidades Históricas e comenta sobre os projetos do Ministério da Cultura em tramitação no Congresso Nacional
Infelizmente no Brasil, menos de 10% dos brasileiros já entraram em um museu, só 13% vão ao cinema e apenas 17% compram livros. Mais de 92% dos municípios brasileiros não têm um cinema, ou sequer, um teatro. A realidade cultural brasileira é dramática, é quase um apartheid cultural, a cultura é inacessível para grande maioria dos brasileiros. Então o Ministério inovou: tivemos a idéia de além de financiar a produção, financiar o consumo cultural. O Vale Cultura é muito simples, se parece com esses vales refeições. O trabalhador terá um cartão magnético, com valor nominal mensal de R$ 50, e para isso ele só paga R$ 5. O governo assume o custo de até 1% do imposto devido de cada empresa, e a partir dai, compartilha com o empresário.
O governo vai pagar entre 60 e 70% desse benefício, e vamos incluir de 12 a 14 milhões de trabalhadores diretamente, podendo estender o benefício à sua família. São R$ 7 bilhões por ano na economia da cultura. Assim, veremos cinemas, livrarias e lojas de discos sendo abertos perto de onde as pessoas moram. Isso vai gerar emprego, impostos, um aquecimento da economia e também vai permitir que o CD legal tenha uma primazia sobre o CD ilegal, que é vendido na esquina. Porque como é um cartão magnético, só poderá ser utilizado em lojas credenciadas, permitindo um controle sobre a venda desses produtos numa escala infinitamente maior do que hoje. Os efeitos positivos do Vale Cultura serão enormes, o maior será colocar a cultura ao acesso de milhões de brasileiros. O presidente Lula enviou a mensagem com a rubrica de urgência, urgentíssima. Está tramitando numa velocidade muito grande, espero que no Natal a gente tenha esse presente para dar aos trabalhadores. Nós vamos assistir nos próximos anos uma queda do preço da entrada do teatro, da entrada do espetáculo de dança, do preço do livro e do preço do CD. O Vale Cultura, além de todos os benefícios, vai empurrar a economia da cultura para um rebaixamento de preços.
PAC das Cidades Históricas
Pela primeira vez o patrimônio histórico não está sendo tratado de forma isolada. Além da sua importância cultural, ele está sendo tratado também como ativo econômico, para o desenvolvimento, geração de renda e ocupação nessas cidades. Precisamos integrar as políticas de patrimônio com outras políticas, por isso estamos trabalhando junto com a Casa Civil, Ministério do Turismo, Ministério da Educação, Ministério das Cidades, Banco do Brasil e BNDES. Não haverá concorrência, as 173 cidades do programa serão beneficiadas. Os recursos estão assegurados. Com o PAC das Cidades Históricas estamos inaugurando uma segunda geração de projetos e ações. São exatamente ações integradas, que articulam infraestrutura urbana, meio ambiente, cultura e qualidade de vida. É preciso disponibilizar recursos para que os prefeitos possam, de forma autônoma e protagônica, desenvolver o processo de preservação do patrimônio do seu município, em comunhão com seu estado. A idéia do PAC das Cidades Históricas é essa. Estimulamos os prefeitos das cidades para que eles criassem a Associação Nacional dos Prefeitos de Cidades Históricas. Essa Associação vai evoluir. Hoje são 163 municípios históricos, mas como o Iphan está analisando uma nova leva de cidades históricas, nós teremos um pouco mais de 200 municípios que precisarão de atenção especial por parte do governo federal. Os governadores e prefeitos são fundamentais nesse processo, pois estão mais próximos da comunidade.
Recursos para cultura
A luta por recursos é histórica na área cultural. A cultura foi, durante muito tempo, eu diria até o ministro Gilberto Gil assumir a pasta – tratada como algo secundário. Como ele dizia, tratado como a cereja do bolo, um enfeite das políticas públicas. Na verdade, a cultura é uma necessidade como é a comida. Não há possibilidade de pensarmos o ser humano sem cultura. O ser humano produz cultura e necessita de acesso pleno a ela para que tenhamos uma sociedade saudável, em condições de enfrentar os desafios do século XXI. Essa mudança de escala, de importância da cultura, deve se refletir no orçamento. Quando chegamos ao ministério, herdamos do governo passado um orçamento de 0,2% do total do orçamento federal. Isso é insignificante. É por isso que temos parte do nosso patrimônio aos pedaços. Não conseguimos montar uma infraestrutura suficiente para o desenvolvimento cultural e para o acesso da população brasileira. Não temos grandes programas de capacitação de artistas, de técnicos e de gestores. Todo o processo de desenvolvimento da cultura precisa de um investimento público. A nossa demanda é a mesma da recomendação das Nações Unidas, que o recurso para a cultura nunca seja inferior a 1% do total. Mas, está tramitando, na Câmara, um projeto de emenda constitucional que reservará no mínimo 2% para cultura, o que vai significar cerca de R$ 6 bilhões. O que é uma escala de crescimento razoável. Aí, eu posso dizer que de fato nós vamos atender às necessidades e demandas da sociedade brasileira em todos os aspectos da cultura.
Lei do Direito Autoral
A maior queixa que nós recebemos por parte dos artistas é que eles não se sentem contemplados com o seu trabalho porque acham que direito autoral é uma caixa-preta. Eles não conseguem ter acesso à contabilidade do recolhimento do direito autoral no Brasil, e a parte que lhes cabe nesse processo. Nós herdamos uma lei do Direito Autoral frágil, da época em que ainda nem existia videotape. Temos hoje um ambiente absolutamente novo, criado pela internet para as novas tecnologias. O mundo inteiro está buscando soluções para garantir a realização plena do direito autoral. O direito autoral se relaciona com o direito patrimonial dos empresários que investem nas obras, e com o direito de acesso da população àquelas obras. É preciso criar transparência e controle público nesse processo. No mundo inteiro tem. Precisamos desenvolver também no Brasil. Nossa posição é por uma modernização do direito autoral no País. E, um direito autoral que não agrida, nem entre em concorrência e competição com o direito patrimonial, e com o direito de acesso pleno da população. Isso é possível, vários países do mundo estão evoluindo. O Japão faz, sistematicamente, uma revisão de todo o sistema de direito autoral deles. Na Europa também estão evoluindo. Já existem soluções pontuais, diferentes em cada país. Nos Estados Unidos também. Sem direito autoral regularizado, nós prejudicamos artistas e não poderemos ter uma economia da cultura forte sem regulamentar e modernizar essa área da cultura. Em alguns países, o recolhimento é feito por instituições públicas e em outros por instituições privadas. Em ambos, há um mecanismo de controle social sobre esse recolhimento e sobre a redistribuição para os artistas. No Brasil não existe. Por isso os artistas chamam de caixa preta. Chegou a hora de começar a modernizar a lei do direito autoral no Brasil. O Ministério da Cultura está empenhado, já fizemos mais de 30 audiências públicas nas capitais brasileiras, com especialistas, músicos, escritores e instituições da área do direito. Estamos preparando um projeto de lei para este ano. O objetivo é gerar controle social sobre todo o sistema de arrecadação e distribuição desses recursos gerados pelo direito autoral.
Do Em Questão