Trabalho escravo e cidadania no campo
A imprensa nacional e interna-cional denuncia com freqüência a existência de trabalho escravo no Brasil.
As denúncias ganham repercussão com a campanha coordenada pela OIT pelo combate a esta forma inaceitável de relação de trabalho e de existência humana. O fato foi objeto de discussão também nesta Tribuna, semanas atrás.
Como explicar situação tão vergonhosa? Por que proprietários rurais ainda mantêm trabalhadores em suas terras, trabalhando como escravos, sem qualquer tipo de direito?
É só uma questão de ganância desenfreada pelo lucro ou é um comportamento enraizado em uma cultura secular de dominação política?
A compreensão de processos históricos nos ajuda a responder essas questões. Depois da abolição da escravidão, em 1888, a maioria dos trabalhadores então libertos teve que continuar trabalhando nas fazendas. O acesso à terra para produzir deixara de ser livre, desde a Lei de Terras de 1850. O emprego no incipiente mercado de trabalho urbano era monopolizado por brancos, situação que se intensificou com a imigração européia, no final do século XIX.
Nas fazendas da região canavieira do Nordeste, por exemplo, a condição dos trabalhadores não era muito diferente da época da escravidão. Sem a proteção de nenhum direito, sujeitavam-se à autoridade do dono da terra: deviam trabalhar de graça alguns dias por semana, recebiam o pagamento em vales a serem descontados no barracão da fazenda, viviam sob constante ameaça de espancamento e de prisão em cárceres privados e suas mulheres e filhas estavam sujeitas ao abuso sexual dos fazendeiros e de seus capatazes.
Em outras palavras, a propriedade da terra continuava a conferir aos fazendeiros enorme poder sobre os trabalhadores. Não havia nada que pudesse contestar esse poder, nem o direito, nem a justiça.
Essa cultura da dominação ainda prevalece em algumas regiões, levando fazendeiros a recorrer ao trabalho escravo, passando por cima da lei, da justiça e do poder instituído.
Departamento de Formação