Um recall necessário
As montadoras deveriam chamar seus trabalhadores e pedir-lhes que esquecessem o que elas fizeram este ano na campanha salarial dos metalúrgicos. Fazer um verdadeiro recall nos métodos de negociação de que se utilizaram e que está lhes custando bem mais até do que realmente nossa atual campanha salarial poderia ter-lhes custado.
É verdade que nós, trabalhadores, embora limitados em nossa unidade – experimentando uma difícil convivência com outras centrais – e capacidade de mobilização, ainda em tempos de crise, fomos capazes de honrar nossa tradição de luta. Mas as montadoras equivocaram-se em vários momentos.
O primeiro e mais grave de seus erros foi o de querer manter sua proposta econômica em torno dos 6,5%, um índice que apenas cobre a inflação do período e que parece ter sido pactuado com diferentes setores empresariais e governamentais para enfrentar as campanhas salariais dos trabalhadores que têm data-base neste segundo semestre.
A inflexibilidade impediu-os de perceber que, diante da retomada da atividade econômica do setor, os trabalhadores não se conformariam com mais um ano de perdas. Acreditavam que iríamos para o sétimo ano sem reagir à altura. De posse desta estratégia constituíram uma bancada negociadora que, apesar de composta por profissionais competentes, não tinha poderes para fazer avançar as negociações. Em nenhuma oportunidade, nem o presidente do Sinfavea, nem qualquer presidente de montadora fez-se presente às negociações, como sempre ocorreu no passado.
Ao chegarmos ao impasse e à decretação da greve, que tivemos o cuidado de cercar de toda legalidade, as montadoras cometeram novo equívoco. Resolveram levantar-se da mesa e recorrer à Justiça do Trabalho, uma verdadeira aventura. Em plena virada de milênio, depois do registro de grandes avanços no relacionamento capital/trabalho, de passos importantes em direção à contratação coletiva e à construção de comissões de conciliação prévia, optaram pelo caminho do retrocesso.
O TRT comportou-se neste caso com isenção e coerência. Primeiro propôs às montadoras uma conciliação com base em aumento de 6,5% já, e uma auditoria nos indicadores econômicos das montadoras, com acompanhamento do Sindicato. Por que as montadoras não aceitaram se o índice proposto era o que estava sendo aceito pelas montadoras na mesa de negociação? O que tinham a esconder?
Ao recusarem-se a permitir a auditoria, as empresas foram para a defensiva. E, nós, trabalhadores, com a eficiente assessoria da nossa sub-seção do Dieese, tínhamos argumentos inquestionáveis: como não poderiam dar aumentos superiores aos 6,5% se haviam conseguido ganhos de produtividade superiores a 100% na década e se tinham aumentado seus preços em mais que o dobro da inflação do período?
A insistência das montadoras em argumentar com a falta de competitividade do custo da mão de obra regional, em particular no ABC, mereceu resposta até mesmo dos juízes. Um deles lembrou às montadoras que tratava-se de atender pedido de reajuste salarial e que não era justo, principalmente por parte de quem vem tirando proveito da guerra-fiscal, recusar-se a conceder reajustes argumentando com um fator que também o beneficia.
Sem respostas para estas questões o dissídio interposto pelo Sinfavea foi a julgamento. Os trabalhadores trouxeram para o Tribunal um argumento que seria decisivo: 19 acordos assinados pelo Sindicato dos Metalúrgicos do ABC com empresas pequenas, médias e grandes, entre autopeças e indústrias de máquinas da região. Elas concordavam em conceder a seus nove mil trabalhadores reajustes no patamar dos 10%. Se estas empresas podiam dar estes reajustes, porque as todo-poderosas montadoras não poderiam fazê-lo?
Com a sentença favorável em mãos, suspendemos nossa greve. Para as montadoras, ficou bem mais caro que os 10% que queríamos antes de decretar a greve. A decisão judicial as obrigou a pagar os dias parados e a concede