Viagem|Ilha Grande sem muvuca

Aproveite o paraíso longe da temporada de chuvas e multidões
Com pouca gente e pouca chuva, os paraísos da Ilha Grande ficam bem melhores do outono à primavera. Pena que a cada alta temporada surjam novas cicatrizes da agressão humana

Por Sucena Shkrada Resk

Assim que a chamada alta estação se vai, a Ilha Grande, a uma hora e meia da costa de Angra dos Reis (RJ), muda de cara e de clima. Sem as chuvas e as multidões do verão, fica perfeita – ou quase, já que muitos visitantes, e até certos moradores, deixam uma nova cicatriz a cada temporada. Entre abril e novembro estão os melhores dias para visitar a Ilha e suas paisagens, que misturam cachoeiras, rios, costões, morros, praias e um ecossistema riquíssimo.

No mínimo três dias “líquidos” são razoáveis para começar – depois, claro, de ter pesquisado todos os serviços de informações para não desperdiçar tempo. Um bom roteiro a pé pode começar pelas águas calmas da Praia Preta, a um quilômetro da Vila de Abraão, onde ficam o cais e o “centro” urbano da ilha. E terminar, duas horas e algumas praias depois, na deslumbrante Lopes Mendes, com seus três quilômetros de areias claras e restingas. Na direção oposta, a caminhada, sempre em trilha aberta e leve, leva a Dois Rios. Ali é preciso ir cedo, pois às 5 da tarde é hora de se retirar. São bons roteiros iniciais para quem gosta, muito, de caminhada. Por mar, o passeio náutico para as chamadas Lagoa Azul e Lagoa Verde, com águas límpidas e calmas, é indicado para quem gosta de flutuação e aprecia a fauna aquática. Com equipamentos simples, como óculos, snorkel e nadadeiras, assiste-se na baía da Ilha Grande a espetáculos pouco vistos no litoral do Brasil.

Pronto. Lá se foram três dias básicos e “produtivos”. Mas foi só o começo. A ilha faz jus ao nome. Tem 193 quilômetros quadrados e mais de 100 praias, e não adianta ter pressa. A menos que se disponha de muitas semanas, será preciso voltar outras vezes.

Riqueza histórica –
A Ilha foi berço da nação dos tamoios, onde viviam os índios tupinambás. Com o processo de colonização, efetivado a partir do século 18, surgiram engenhos de cana-de-açúcar. Ao mesmo tempo, a baía era ponto de desembarque para quarentena de viajantes e tráfico negreiro. De acordo com historiadores, dom Pedro II mandou construir para isso o Lazareto (onde hoje fica Abraão), que depois passou a ser presídio político, em ruínas desde 1932. A Colônia Penal Cândido Mendes, em Dois Rios, “hospedou” celebridades como o escritor Graciliano Ramos e o bandido João Francisco dos Santos, o Madame Satã, acusado de mais de 100 assassinatos. O Centro de Estudos Ambientais e Desenvolvimento Sustentável (Ceads) da Universidade Federal do Rio de Janeiro quer fazer da área um ecomuseu a céu aberto.

A Ilha Grande começou a virar área ambiental protegida nos anos 1970. Mas desde o início dos 2000 procura maior definição quanto à competência administrativa. É um pedaço de terra cercado por interesses de todos os lados. Do governo municipal de Angra, do estado do Rio e federal, por se tratar de área de segurança. Todos com alguma casquinha para tirar aqui e uma responsabilidade para empurrar ali.

O território faz parte da Área de Proteção Ambiental (APA) Tamoios e é reconhecido internacionalmente pela Unesco como Reserva da Biosfera. Abriga, em 87% de sua área, o Parque Estadual da Ilha Grande, a Reserva Biológica da Praia do Sul e o Parque Estadual Marinho do Aventureiro.

Mas nem tudo é beleza. Construções irregulares e turismo desenfreado agridem o local, onde ainda não há plano de limitar entrada de gente. O volume de lixo e de esgoto e as interrupções temporárias de fornecimento de água e energia nos períodos de pico são comuns. Em Abraão vivem mais de 3.500 pessoas e há infra-estrutura para receber 7.500. No entanto, Carnaval e Réveillon atraem mais de 25 mil. “O último Carnaval rendeu 200 toneladas de lixo”, conta o assessor técnico da subprefeitura, Lu