Você conhece… Você confia?
Foi uma longa batalha no chão da fábrica. Uma semana de greve, negociações que atravessaram fins de semana com a cúpula da empresa no Brasil e na Alemanha. Na mídia, uma guerra para sensibilizar a opinião pública contra o despropósito das 3075 “teledemissões” (por carta) e contra as tentativas de carimbar nas nossas bandeiras ou a marca da intransigência ou a vilania da redução dos salários.
O impasse, que durou um mês, chegou ao fim na última quarta-feira, quando 16 mil trabalhadores da Volks aprovaram acordo que reverte demissões, flexibiliza a jornada, mantém a renda mensal dos trabalhadores e garante ao ABC, por um período de cinco anos, novos investimentos e manutenção dos níveis de emprego na fábrica.
Será impossível entender a inteira dimensão deste acordo sem levar em conta aspectos estruturais que conformam hoje um e outro lado desta equação, empresa e trabalhadores. Você, leitor e leitora, conhece a história dos metalúrgicos do ABC desde o final dos anos 70. Só a partir desta história é possível entender o nível de organização e consciência que os trabalhadores da Volks acumularam até hoje. E é por conta dela que eu posso dizer que o acordo que acabamos costurando na Volks não seria possível em nenhuma outra empresa sem organização no local de trabalho.
Hoje, nós temos dentro da Volks uma comissão de fábrica com 36 membros. Há pelo menos cinco anos, desde que a Autolatina dissolveu-se, nenhuma decisão sobre recursos humanos é tomada sem que nossa representação tome posição. Na Volks, o PLR representa, na verdade, 14º e 15º salários para a média dos trabalhadores.
O processo de acúmulo de forças muda de qualidade em 1997, quando o Sr. Demel anunciou 10 mil demissões e foi forçado a recuar. Continuou em 1998, quando, também depois de grandes mobilizações e, inclusive de contatos com o vice-presidente mundial de RH, Peter Hartz, fizemos reverter 7.500 demissões em cima de um acordo de flexibilização de jornada e desligamento calendarizado de aposentados e voluntários. A esta altura, naturalmente, a crise estrutural da Volks no ABC já aparecia em toda sua gravidade.
A planta de São Bernardo era, então, das mais antigas do grupo. Seus produtos eram todos anteriores à abertura descontrolada da economia brasileira, ainda que mantenham até hoje grande aceitação no mercado. É o caso da Kombi, que é de 1959 e do Santana, o mais novo deles, de 1984. De qualquer forma, em 1998, estavam (e continuam hoje) com dias contados.
Foi naquela luta contra as 7500 demissões que garantimos uma primeira iniciativa da empresa no sentido de modernizar a planta Anchieta: o investimento de R$ 2 bilhões na plataforma do Pólo, a PQ24, planejada para entrar em operação em março de 2002. Foi esta decisão que, de fato, impediu a planta da Anchieta de seguir a marcha à ré das unidades da Volks em Puebla, no México, e Joanesburgo, na África do Sul.
Mas a operação do PQ24 ainda não será o bastante para garantir os 16 mil postos existentes hoje na fábrica de São Bernardo. Quando muito, ela mobilizará 6.500 trabalhadores, desenhando uma fábrica que não empregará mais que 10 mil trabalhadores no total. Ou seja, quando o apagão e a retração dos mercados tomaram conta do segundo semestre de 2001, a crise da Volks ganhou contornos dramáticos, para milhares de famílias. “Você conhece, você confia” dizia a Volks aos seus consumidores, enquanto por trás das suas máquinas os trabalhadores se debatiam na incerteza do futuro imediato.
Em meados deste ano, portanto, a crise estrutural da empresa somava-se à crise conjuntural de mercado provocada pela gestão desastrosa da economia brasileira. A Volks procurou o Sindicato e propôs solução para a crise conjuntural representada por um excedente 3000 trabalhadores.
Do lado de cá, no entanto, a ótica era outra. Sabíamos que, ou aproveitávamos a crise para enfrentar o problema de uma só vez ou não haveria outra chance. Seriam 3000 agora e outros três ou